terça-feira, 7 de agosto de 2012

Hoje acordei um monstro
os olhos mal se abriam
olhei-me no espelho e
estava toda deformada
assustei

Abri a janela e a luz do dia
o azul do céu
me doeram mais
o vento confirmava
que nada mais fazia sentido

Toda a existência do mundo
de todas as coisas
de todas as pessoas
da areia do deserto
o fio de cabelo branco
todas as infamias humanas
desde o primeiro hominídeo
as pedras lascadas
as engrenagens
senhoras na ópera
moças de salto alto
homens engravatados indo ao trabalho
o pó da cidade
a poluição
o ar fresco do campo
infinitamente a terra vermelha dos pastos
por baixo da grama verde
as plantações de milho café aveia
as sementes de girassol os papagaios
que a comem os laços
sanguíneos os
rios cachoeiras
as teorias e os teoremas
todos os pintores e filósofos cinemas
salas de fumar saunas
ilhas desertas
tudo
num mesmo segundo
pesava sobre mim

Abri minha carteira
e numa ironia da vida
vi os responsáveis pela minha existência
meu pai numa foto em preto e branco talvez
de uniforme camuflado
- tiro de guerra ele fazia, talvez -
minha mãe mais nova
o cabelo quase enrolado
fechei de súbito

Quase engatinhei ao banheiro
me joguei debaixo do chuveiro descrente
abri e a água quente quase queimando
meus pêlos
meu rosto gigante que eu precisava
segurá-lo abrir meus olhos
com os dedos
delicadamente doíam
e era um esforço pra não chorar era um esforço
danado
eu mentiria que era a água ardendo meus olhos
mas era o mundo era eu
no fundo do ralo tentei
levar pro ralo aquela coisa
o monstro a deformação

aos poucos me enxuguei
botei um óculos de sol pra me disfarçar
como se adiantasse alguma coisa
eu sentia minha pálpebra pesando sobre meu
pobre olho meu pobre olhinho

comi uma laranja uma banana
sentada no sofá
e sentada permaneci




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