quinta-feira, 21 de abril de 2011

Flocos Iluminados Rodando

Um som de piano de fundo, tocando talvez a Valsa nº 6 de Chopin, tocando mesmo, bem de fundo, os olhos meio acordando, as pálpebras abrindo. No céu escuro pontos brilhando, como fogos de artifício, flocos luminosos.

Capricho nº 24 de Paganini.- Rodopiando o corpo sozinho no meio da grande sala com chão de madeira. Soavam ocas as batidas dos pés. Quase um balé. E caindo, bem de leve, girava toda imagem à sua volta, numa mistura de cores. Brincava de dançar com os dois dedos da mão, o indicador e o outro, obsceno.
Se menina seria Olívia. Nunca me mostrou o rosto, mas ardia com seus pés nas minhas costas, as mãos no meu pescoço, balançando a cintura grudada na minha. Como era doce seu perfume, chegava a me enjoar, mas eu gostava, era ela, era dela aquele cheiro, só dela. Rodopiava me embriagando, entorpecendo já de um cheiro cítrico, misturado com suor doce, com valsa nº 1, com meus olhos cansados, ardendo do calor que ela soltava. Eu era um refén de sua dança. Era eu que a via mergulhada naquela bolha colorida, uma bolha de sabão gigantesca que cabia quase a sala inteira e diminuia, focando os olhos dela, que giravam e giravam e caíam, por um segundo, depois me olhavam, de repente, com violência, me atingindo selvagem, enquanto eu sentado, respirando fundo, já completamente embriagado, desmaiando.
Se menino seria eu, Thomaz. Nome nenhum. Tentando tocar violino, mas em vão, tentando tocar piano, mas meus dedos já caíam. Apenas ouvia o roído máximo dos pés tocando levemente a madeira, depois encostando em mim. Depois eu caía em cima dela e rolava por cima, ela, prendendo meus braços, uma onda com o corpo, encostava o nariz no meu, me provocando, e eu sorria, de canto, já entregue. A maneira como ela me olhava, me segurava e soltava, bem depressa, que eu nem sentia, estirado no chão eu ficava, o som agudo entrando na alma, no fundo do ouvido, me desequilibrando.
era um sonho, quase acordando, não queria. Olívia.
eram flocos iluminados de fogo queimando aquela teia que eu caí
na garra serena de Olívia, uma bailarina, uma coisa cor de rosa bebê, numa enorme sala com um sofá enorme. eu era pequenino, eu acordava.