terça-feira, 24 de agosto de 2010

Vapor Maravilha

Algo que soe, como sempre, com a diluição instantânea do tempo bom, do tempo-maravilha. Esse sensação de dilatação passando voando no seu nariz, outro dia, já é outra hora, vamos acordando. O vapor do banho cheirando dove, refrescante, box esfumaçado. Passa  mão no espelho pra desembaçar, faz um coração, depois rabisca alguma coisa com o dedo indicador e vê seus olhos. Faz careta. Ah, essa coisa boba que passa rápido.

Escrevi seu nome, depois fiz um leão, depois uma dança sensual no banheiro, sozinha e encrenqueira.
Citando as coisas do tempo maravilha estão outras coisas, como te encontrar e fazer Amor com você. Lou-ca-mente. De dia, de noite, de tarde, de manhã, quando acorda, pulsando pulsando pulsando. O banho. Comer batata frita e tomar suco de morango com leite, batido no liquidificador. Um beijo por trás. Sinto um arrepio. Seu cabelo é lindo e que sorriso! que corpo! desliza na minha mão. Me puxa, me joga no quarto de janela semi fechada de cortina remendada. E louca-mente mente que tem que ir embora rápido, porque o tempo urge, uiva, cadelo. Cadelão. Vê-se pela luz da janela que vai mudando de tonalidade, de cores, do claro pro laranja, pra noite e chegou a hora. Mais 5 minutos. Te agarro rápido e evapora, exala cheiro de quem-acabou-de-ter-um-espasmo. Maravilha. Sorrio safada, cretina. Que isso, sou um anjo. Que isso, tempo maravilha, com mil bocas sou engolida e me perco nos braços quentes, tempo maravilha, dá um tempo e vê se pára,que não tô afim de olhar no relógio pra ver seus ponteiros diários. Não e não. Te jogo no lixo. Taco fogo. Mas aí repenso, me jogo debaixo da cama pegando um trident que caiu do bolso - trident de melancia - repuxo o cabelo no alto, baforo o espelho e escrevo besteira. Falo besteira. Penso besteira. Tudo colorido, às vezes preto e branco, às vezes só branco, vermelho e branco, a cor que você quiser, meu benzinho.
Do vapor no nosso corpo. Amanhã tem mais. Mas passa que é um avião de rápido. Maldito. Tempo maravilha, dilatando, remoendo meu coração, meu corpo, meu prazer.

Se Teresa me falasse...

(ouvir com Chopin - Valsa n° 1 )


Ah! Se Teresa me falasse que eu não devo tomar sereno...
Correria de medo, peito cheio, os olhos grandes
e ficaria em casa, deitada e coberta.
Se Teresa me falasse que o mundo é uma mão que nos agarra
eu teria tanto medo e me encolheria no colo dela, enquanto a sentiria acariciar meus cabelos.
Se Teresa um dia me dissesse que o Amor dela é um mar infinito de peixinhos coloridos, eu pularia de alegria, viraria cambalhota, assobiava canções lindas e imitaria passarinhos, sentiria-me voar por entre as árvores e a abraçaria bem forte.
Se Teresa soubesse o quanto eu gosto dela, e eu já devo mesmo ter falado, ela sentaria numa rede nesses dias preguiçosos de verão, e passaria a me contar histórias de seus tempos remotos. Mas ela já faz isso... será então que ela sabe que eu gosto mesmo dela? Que eu gosto da sua comida bem temperada, da carne com mandioca, do feijão cozido na hora e do arroz doce que só ela sabe fazer... e se ela me falasse que não sabe fazer doce de abóbora eu faria um bico desse tamanho, porque eu não acreditaria nisso, é claro que é mentira, porque ela sorriria por não conseguir mentir tão cabeludamente assim. Ah! Teresa! Você é um anjo!
Se Teresa me falasse a verdade de tudo, se ela me falasse o quanto o céu é lindo e o quanto eu sou tão especial, eu acreditaria. Mesmo ela falando que sou alguém muito chata e teimosa e marota, com um ar de brincadeira, eu também acreditaria, porque é verdade. Ela fala doce, sem querer machucar, ela fala sério, ela dança, ela mima. Acredito sim.
Se Teresa me falasse tudo... e ela fala, eu acredito. Nos pássaros voando, nas histórias infantis, no mundo lindo lá fora, na bondade das pessoas, tudo que ela me conta. Que bondade. Me faz um cafuné, eu te faço um café com canela e sentamos aqui conversar.
Ah! Teresinha! Você é um Anjo.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

De Repente Ilusão

Que coisa linda
Que coisa louca
E tudo
e tanto
pra quê?

O que foi
e não foi
..
e será algum dia?

Será?
O que faz o tempo enquanto me espera?
O que faz o destino enquanto não arma contra mim?
E as árvores, o que fazem sem florescer?

Não sei.
Sem contactos, por favor.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Parado o Tempo

O que é o tempo senão nós mesmos passando? Um fio entre a vida de um e a morte do outro, o tempo que nunca morre, o tempo que só é ele porque é assim que tem que ser. Não fala. Não cheira. Não dirige caminhões barulhentos. O tempo não existe. Sou eu, infame vida, diluída num espaço. E quando eu morrer? Cantarão louvores? Morrerei?
Deixarei de existir e o mundo será sempre a mesma coisa. O tempo correrá. O tempo não fará nada. Só passaremos. Ou passarinho.
As coisas se repetem num paralelismo. Mãos e braços fazem sempre o mesmo movimento e eu te apertei contra o meu corpo. Não foi em vão.
Repetem, as coisas se repetem, mas não são as mesmas. Criam, recriam. Tudo se transforma, ó Lavoisier. A Flor renasce do adubo. O germe que faz a mão. O leite em pó vira leite mesmo assim. Mas o Tempo, o tempo não renasce. Escorrega numa linha tênue do universo que sequer existiu. Há nessa coisa imensa um limite? E o que hei de me preocupar com minha tosse? Ou se você vai rezar ajoelhado na igreja, ou se cagaram na calçada de casa? O tempo não sabe.
O tempo não sabe mas ele comete crimes. Você que não sabe, mas é um ponto mínimo num ponto mínimo de vida. De vida. Que quer dizer morte? Se vivemos é porque vamos morrer. Se morro é porque vivi. Não necessariamente na ordem natural. Ordem invertida. E se vivemos na morte? Que tempo é esse?
Agora, na madrugada, ouço um caminhão. Logo ele irá embora, pode ser que demore. Em casa as pessoas dormem. Morro de sono, mas insisto. Uma vaga ideia existencial. E crianças que nascem mortas?
Pra que tantas perguntas, meu Deus... se sabemos que não temos resposta. E se tivéssemos, que importaria uma a mais outra a menos. Os destinos sempre serão os mesmos. Todo mundo passou pelo portão da vida, agora caminhamos com os pés soltos em direcção a árvore genealógica. Gerações e gerações. Ramos de folhas, frutos, ó!
Mas não há mais tempo. O caminhão continua lá com seus barulhos nocturnos. Tenho preguiça de olhá-lo. Devo dormir logo, o sono é pesado, me fecha os olhos. É Tempo de dormir.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Poema Desconhecido

tem hora que bate uma coisa no peito
não sei se é saudade
não sei se sou eu
ou esse frio cortante
mas bate
e bate forte
feito vento de tarde na porta suspensa

tem hora que bate uma coisa no peito
se é solidão, eu não sei
veia estourando
imagens do passado
um presente perdido
ah! se eu soubesse
tem hora que não sei

engolindo qualquer coisa
arrumando o cabelo
relendo uma nota
esquecida no ar
de aguar os olhos
fazer lembrar
lembrança que não existe
mas está lá
balançando na gangorra
aqui, no peito
aqui, nos olhos
no sorriso
aqui
comigo

tem horas que sei lá.

Quando Vomito Qualquer Coisa

Algum jeito que não tinha. Sei lá, era meio estranho. Não tinha jeito nenhum, desses meio sem sal nem açúcar. Chocho. Chuchu. Sem graça. Insosso. Era pouco. Mas era, vou ter de admitir, de uma inteligência falha, inacessível. Por ser inacessível era incompreensível. Escrevia no final do caderno as frases soltas que vinham na cabeça " o prendedor de roupa prendeu meu nariz/ não senti/ desamei/ se é que eu amava". Assustou. Ele amou algum dia e amor não era pro bico dele. Quem me dera.... Alguns desenhos desalmados também pelo caderno.
Ah! Eu não sabia mais o que escrever. Agora sou eu quem digo. Que menino é esse que só o sei por essas linhas que escrevi? Alguém que conheço? Não consigo inventar. Não consigo escrever essa fome diária de palavras. Sinto uma vontade imensa de desembuchar tudo aqui, cuspir, vomitar, berrar, mas há algum tempo não sai absolutamente nada que preste. Nem rabiscos no final do caderno. Quiçá uma ideia vaga aqui ou ali, uma aula de literatura que me inspira, mas.... mas na hora do vamos ver fico paralisada como um animal empalhado. Empanado? Porque não?
Algo dentro de mim borbulha querendo sair, não sei o que é. Se soubesse de imediato já havia dito. Escute. Um tiro lá fora. Todo mundo dorme. O sono quase me fecha os olhos, mas resisto. Quero escrever. Quero tirar fora essa macumba nojenta. Quero escrever, porra. Não é possível. Antes eu engolia milhares de coisinhas e cuspia em formas bonictas-horrendas de meia dúzia de palavras. Minha barriga ronca. Meia dúzia de palavras e eu me sentia nova em folha. Como depois de passar uma análise, um banho de sal.
Que menino é esse, meu deus? meu bom deus. me guarde. rezo. acredito. as coisas parecem sumir de mim, evaporam, arredam o pé pra longe, se é que um dia estiveram perto. achei, de repente, que os olhos alheios vissem infamias minhas. porque quis? porque quis ser infame, eu, aqui, falando nada com nada. Nem vinho, nem cerveja, alguns olhares, mas aquela poesia que me comia por dentro, aquela dor clichê de sentir o mundo no estômago parece ter sumido de mim. E falo isso com saudade da dor mais sincera possível. Também é um erro pensar que para vomitar essas coisas infames é preciso estar com a dor do mundo. Mentira. Mas eu, eu que dramática como sempre fui, não posso negar. E a felicidade? E essa ânsia toda pelo cinza, preto&branco, mono cromático, pontos, no mundo colorido?
Ainda estou com sono e todos dormem. Digo: todas. Faz frio, como sempre, nesses últimos tempos e isso me agrada. Queria gritar pro mundo, me perturbar. Mas estou perturbada por não estar perturbada. Não sei como faço. Deveria dormir talvez. Um gole de água gelada cortando a goela.
O menino rabiscou o caderno de novo. Um dia, talvez, tenha amado. Mas não sei quem ele é. Ele, muito menos. Não nos conhecemos. Sofremos do mesmo mal.

domingo, 15 de agosto de 2010

Recorte

Do ponto de ônibus vejo as pessoas dançando por trás da janela.  Rodopiam seus corpos, erguem os braços leves, o cabelo de alguma moça sobrevoa o ar frio que entra pelas frestas. Avisto uma moça de verde. Ela é a única que me chama atenção. Os outros são espíritos brancos pagando alguma promessa de corpo diluído. Mas ela dança bonicto e eu não vejo o seu rosto, que ela esconde do lado do rosto do rapaz que não é o lado que eu vejo. Eles dançam e eu a sinto sorrir com o corpo, com o movimento alegre, com o verde. Os outros não têm vida. Continuo não vendo seu rosto. Apenas seu cabelo e seus braços e suas costas. Queria dançar com ela.
Ela entrou por aquela porta ali, do outro lado da rua. O salão de dança é a parte de cima de um sobrado meio cinza, como todos os outros. Tem alguma coisa de vermelho nele e o verde que vem dela. O resto é branco. Os ônibus passam toda hora e nenhum é o qual eu pego. Pessoas entram e saem, brotam, vão embora, e eu fico. Olhando o olho mágico do tempo e ele só me engana. Volto novamente meus olhos para a parte de cima. Alguma coisa me diz que eu já vi isso antes, agora, aqui. Quem sabe... Alguém ainda do mesmo ponto de ônibus comenta sobre os dançarinos. É uma escola de dança, eu acho. Só os vejos da cintura pra cima. Dançam bonicto. A moça de verde sumiu. Espíritos rodopiam.
Pessoas em volta se agitam. O ônibus chegou.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Das situações

Mês de agosto passa num gole gelado doendo a garganta. Mas qualquer mês passa. Vejo pessoas brotando do nada, vejo meninos dormindo na rua. A juventude triste com seus cabelos engraçados nos ônibus da meia noite, cigarro, cerveja, 13 anos, outros mesmos tempos que mudam e voltam. Os jovens desanimados com a vida, tentando resgatar uma superfície densa em coisas inúteis e caíram. Levam agora o ombro pesado, os olhos pretos de noite, porque o dia não faz sentido, a noite ajuda quem o sol despreza. E não fazia sentido nada antes, nem agora, nem depois do mês de agosto. O tempo era frio e calor em dias alternados. Ou era frio demais ou um calor insuportável e a gente também oscilava com essa brincadeira da Natureza. Se um dia virava o rosto pra esse lado, no outro estava mergulhado num balde com água fria, congelada dos dias anteriores.
... dia-a-dia comendo o mesmo biscoito de polvinho, dia-a-dia chupando esse osso amargo de galinha quase viva. Limpando os dentes com a unha e cuspindo, quase na face alheia, os restos mortais de penas e cacarejos. Porque sabia que depois não poderia comer outra asa ou grudar biscoito no dente. Mas era inútil como furar a barriga por ter comido prego. E o sol se punha, pensava. E não era inútil.
E aquilo tudo que ele sentia era mentira. Disenteria. Cacarejava. Era dor que nem doía. Era Amor que não vinha. Era a mesma enfadonha sensação de que o dia seria outro, como todos, ou igual, como todos também. E era Amor aquilo que doía. Era Vida aquilo que vivia.