terça-feira, 17 de agosto de 2010

Quando Vomito Qualquer Coisa

Algum jeito que não tinha. Sei lá, era meio estranho. Não tinha jeito nenhum, desses meio sem sal nem açúcar. Chocho. Chuchu. Sem graça. Insosso. Era pouco. Mas era, vou ter de admitir, de uma inteligência falha, inacessível. Por ser inacessível era incompreensível. Escrevia no final do caderno as frases soltas que vinham na cabeça " o prendedor de roupa prendeu meu nariz/ não senti/ desamei/ se é que eu amava". Assustou. Ele amou algum dia e amor não era pro bico dele. Quem me dera.... Alguns desenhos desalmados também pelo caderno.
Ah! Eu não sabia mais o que escrever. Agora sou eu quem digo. Que menino é esse que só o sei por essas linhas que escrevi? Alguém que conheço? Não consigo inventar. Não consigo escrever essa fome diária de palavras. Sinto uma vontade imensa de desembuchar tudo aqui, cuspir, vomitar, berrar, mas há algum tempo não sai absolutamente nada que preste. Nem rabiscos no final do caderno. Quiçá uma ideia vaga aqui ou ali, uma aula de literatura que me inspira, mas.... mas na hora do vamos ver fico paralisada como um animal empalhado. Empanado? Porque não?
Algo dentro de mim borbulha querendo sair, não sei o que é. Se soubesse de imediato já havia dito. Escute. Um tiro lá fora. Todo mundo dorme. O sono quase me fecha os olhos, mas resisto. Quero escrever. Quero tirar fora essa macumba nojenta. Quero escrever, porra. Não é possível. Antes eu engolia milhares de coisinhas e cuspia em formas bonictas-horrendas de meia dúzia de palavras. Minha barriga ronca. Meia dúzia de palavras e eu me sentia nova em folha. Como depois de passar uma análise, um banho de sal.
Que menino é esse, meu deus? meu bom deus. me guarde. rezo. acredito. as coisas parecem sumir de mim, evaporam, arredam o pé pra longe, se é que um dia estiveram perto. achei, de repente, que os olhos alheios vissem infamias minhas. porque quis? porque quis ser infame, eu, aqui, falando nada com nada. Nem vinho, nem cerveja, alguns olhares, mas aquela poesia que me comia por dentro, aquela dor clichê de sentir o mundo no estômago parece ter sumido de mim. E falo isso com saudade da dor mais sincera possível. Também é um erro pensar que para vomitar essas coisas infames é preciso estar com a dor do mundo. Mentira. Mas eu, eu que dramática como sempre fui, não posso negar. E a felicidade? E essa ânsia toda pelo cinza, preto&branco, mono cromático, pontos, no mundo colorido?
Ainda estou com sono e todos dormem. Digo: todas. Faz frio, como sempre, nesses últimos tempos e isso me agrada. Queria gritar pro mundo, me perturbar. Mas estou perturbada por não estar perturbada. Não sei como faço. Deveria dormir talvez. Um gole de água gelada cortando a goela.
O menino rabiscou o caderno de novo. Um dia, talvez, tenha amado. Mas não sei quem ele é. Ele, muito menos. Não nos conhecemos. Sofremos do mesmo mal.

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