quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Leões

Eu continuo gostando muito de você
como quando vejo o sol no céu azul com nuvens e campos floridos.


1



Imaginas que cultuo muito esse mundo de ideias e palavras. Não é atoa que sou o que sou, com o maior direito de sê-lo. Levo tudo isso como um mundo meu, um cuidado de me entender inteira em partículas aleatórias, sem disciplina nenhuma. Escrevo sempre o que sinto, com a maior possibilidade de verdade e do ridículo e afinal, não me importo com essa demonstração gratuita de ser humano em crise, essas entranhas mal dormidas com gosto azedo. Não me impeço de demonstrar o que sinto e o que sou. Sou isso que me acompanho e me vejo em emaranhados eternos e lembranças, afetos e densidade. Porque é uma vida que se vai. É uma vida que tenta ir. Como sempre me deixei levar por essa mão maior que nos afaga e corrompe.

2


O que mais me doeu em tudo isso, nesse caso específico, nesse acto indefinido, nesse afecto entre eu e você (não você, meu querido) foi justamente o facto de ter me arrancado algo. Senti que o que me foi tirado foi justamente o que mantinha nosso mundo interligado. Como se as palavras, essas que me traduzem e traduzem tudo o quanto sentimos, fossem nosso único meio e um dos mais bonictos meios, de ter todo um jardim com borboletas e passarinhos. Quando aquelas palavras num texto, de profunda dor e ironia, me foi arrancado, te foi arrancado também, por algo que me deixou profundamente magoada e esmagada. Eu não sabia o que fazer. Minha boca calou, meus dedos, coitados, congelaram e por um momento senti meu coração sendo furado com pequenas agulhas. Naquele momento eu percebi que você não se importava comigo, que nosso vínculo havia se quebrado, enquanto eu ainda suspirava. Senti-me, egoisticamente, em segundo plano, mas num plano que era eu e você e não havia mais ninguém que pudesse estar em primeiro. Não sei se é tão confuso ou se dói de tão explícito.

Minha boca está muito seca. Quis derramar algumas lágrimas mas me contive. Minha vontade era mesmo estar num quarto sozinha e deitada, me embriagando de vinho, me banhando de vinho, e meu corpo ensaguentado de vinho, até eu rir e rir e rir pra explodir as paredes, pra invadir outra atmosfera e depois chorar igual um bebê abandonado. Essa era a minha vontade. Chorar porque me sinto completamente presa. Eu me sinto tão incapaz, um amargo, alguma coisa entre lama e vermes. Minha vontade maior, meu escuro do mundo, era mesmo encontrar o que você quer. Porque você me disse, um pouco antes de eu sentir tudo se desabando sobre minha cabeça, que eu era tudo o que você queria. E ai tudo se contradizeu em questões de segundo: meus olhos piscaram, meu sangue fluiu, um mosquito passou e . E eu não me vi. Eu não te vi. Eu não nos vi mais. O escuro se escureceu mais ainda e não via outra saída e pensava - mas isso não é possível. Sentia todo o sangue me borbulhando; apenas de um lado, o meu, porque você não me fazia parte mais, não era mais minha ( um terceiro lado foi imposto). Você escolheu e eu não fui a escolhida. Eu senti tão dolorido que não era eu. Como se nossas mãos tivessem se separado.

3

Minha boca continua muito seca e isso parece piorar a cada letra. O ar me arranha. Parece que alguém me tirou a capacidade de alguma coisa que me é muito importante.


4


Você não me escolheu. Ainda fez questão de que eu a visse em fotos e recados. Não suportei mesmo. Um martelo na minha cabeça.
Estava pensando, antes de dormir: porque uma realidade invadiu a nossa?. Porque a verdade me foi dada e porque a verdade não foi dada para a outra? Achei um tanto injusto. Aliás, eu to me achando totalmente ridícula. hahahahahahaha. Que novidade. Eu to me achando uma derrota imensa. Que minha única vontade nesse exato momento era exterminar tudo o que me faz estar longe de você. O problema maior é você não me querer mais. E rio mais de dor do que de orgulho. Rio de desespero.

5


Estou falando tudo o que me está intalado na garganta. Garganta seca. O coração está fluindo, fraco, mas está. Eu nunca sei o que fazer, que posição tomar, que a puta que pariu. Eu sempre acho que não valho o pão que eu como. Ainda se eu tivesse um porquinho da índia.

6


Hoje vi um campo florido. Quase todo dia vejo na verdade. Pensei em milhares de coisas e uma onda imensa de palavras caiu sobre mim. As palavras que eram suas. Um campo florido. Eu não peço tanta coisa e estou contente com o que tenho, mas a única coisa que eu não tenho me deixa nervosamente triste. Me faz, mais uma vez, estar no fundo do poço arranhando a terra e comendo-a. Nunca vi tanta ironia e maldade do destino. Nunca me senti ilhada e jogada dessa maneira. Afinal, há sempre um novo modo de dor.


7


Preciso crescer. Meu exoesqueleto está me sufocando. Pensei nisso esses dias. Pareço um insecto. Um insecto com calça furada embaixo. O cabelo, como sempre, um cogumelo. As poucas vezes que sorri foi meio de lado. Hoje me perguntaram se eu estava triste. Disse que não. Não sei porque disse isso, afinal eu estava mesmo triste. Disseram-me então que minha cara é de quem está triste. Falei que era cansaço e e que estava com sono ( que não deixava de ser verdade). Não devo me ver no espelho há muito tempo, nem lembro como é minha cara de triste e não consigo disfarçar. Fico mole, quero alguma coisa impossível, a água desce meio quadrada. Literalmente eu não tenho chão e aí me diminuo menor que uma formiga, porque até ela deve ter alguma certeza nessa vida. Nem beber eu consigo mais. Ainda me embebedasse. Algumas coisas me parecem absurdas(pra não dizer tudo). Minha vida, uma ilusão. São Paulo, tão grande e tão pequena ao mesmo tempo. Sufocante. E aí eu tenho que escrever tudo. E talvez essa fosse uma esperança mínina de vida. Fosse um escape pra um nada, mas um nada diferente do nada de antes. Eu tenho que escrever tudo, não posso segurar essas coisas que entram em mim, sem eu deixar. Minhas portas estão tão abertas assim? Escrevo para diminuir a pressão sanguinea, talvez menos que a psicológica. Talvez menos que essa bolha densa. Um lençol enorme me envolve e não tem cor, mas se tivesse seria cinza. Se tivesse cor seria um céu cinzento como esses que fazem ultimamente em plena primavera. Logo a tardinha, sentei numa carteira da sala perto da janela, e reparei que havia uma árvore grande com florzinhas amarelas que caiam constantemente e banhavam o chão que estava todo colorido entre verde e amarelo. Aquilo me deu uma paz. O céu neutro, sem opinar em nada na Natureza. - Deixa essa menina olhar a árvore e as flores caindo - permitiu-me a natureza.
Preciso crescer. Cresço eu ao longo do tempo?

8


Minha história com você eu não sei definir. Precipita algo aqui dentro. Por mais humilhada e estraçalhada, algo me faz continuar. Sozinha? Querer você sem você? Acho que preciso mesmo de um bom correctivo. Nascer de novo, porque não sei de onde vem essa sina irônica.
Eu sempre, a partir de algum momento muito mágico e sublime, gostei de você. E nunca, acho, senti o poder dessa palavra: gostar. Não é nem adorar e nem amar. É gostar e isso me pareceu de um peso imenso, porque sempre fui sincera quanto a isso. Foi o primeiro gostar que me doeu e me pesou. Foi um gostar gostar mesmo e não tenho dúvidas. Tem coisas que não tenho dúvidas, mas são poucas e me agarro com unhas e dentes nessas pequenas verdades. Pequenas verdades. Já teve alguma grande verdade? Verdades absolutas, conceitos concretos, pensamentos brutos? Mas verdades pequenas, estas sim parecem fazer sentido. Gostar. Um pouquinho. Gostar tanto. Por um momento me vi brincando com novelos de lã, igual um gato, espichando as unhas e arranhando meu corpo. Gostar, que engraçado. Deve haver alguém que goste de mim. Ela talvez não saiba que eu goste muito dela. Ela talvez não saiba o quanto me entreguei, bamba e ridícula, passos no escuro, as mão nas paredes ( se houvessem paredes). Nem fosse de tudo obrigada a saber. Nem fosse imposto a saber. Mas eu desejei intensamente que aquele sorriso me devorasse e me fizesse a mais destroçada dos seres. Sabe, esses sorrisos que te deixam suando? Disse uma vez que era um sorriso cheio de coração, e eu poderia sentir a respiração dela quando eu fosse dormir. Todas imagens me vem à mente. Tudo que se passou, flashs e momentos únicos. Ainda sou um gato rolando com um novelo. Pulo do sofá. Lembro que posso beber leite no potinho meu. Não sei meu nome. O novelo some de repente. Uma alegria momentânea, se não fosse minha cara triste de hoje de manhã.
Mas eu quis agora estar feliz. Lembrei-me dela e que um dia, pelo menos senti seu perfume, num papelzinho. Pelo menos um dia eu a tive inteira minha e eu ocupava aquela mente, aqueles desejos que evaporaram. Um dia pelo menos, tenho certeza. Tenho certeza. Se o universo não for tão ruim assim comigo, que minhas lembranças sejam boas e doces. Que eu ainda permaneça nela.

9

Um mantra. Você vai se lembrar de mim: quando sentir o vento batendo no seu rosto; quando vir um campo florido com flores amarelas( vermelhas, roxas, líriios, rosas...); quando o céu estiver azulzinho e o sol, de leve, banhar teu rosto sereno e lindo. Vai se lembrar quando ouvir Stereophonics, Rita Lee ou qualquer bobagem do Cazuza quando estiver no teu quarto olhando para o teto ( será que você ainda pensa em mim?). Quando ouvir Pink Floyd, Yael e aquela musiquinha Toxic cantada por ela. Minha imagem virá na tua mente quando você beijar outros lábios, e sentirá um agulhinha te enfiando no coração, um tremor no corpo, um vinho. E vai se lembrar de mim quando reler minha carta e vir meus bilhetinhos jogados em qualquer canto do teu quarto. Vai se lembrar de mim quando alguém de São Paulo te ligar. Quando a água da chuva cair sobre você e vai abrir o guarda chuva lembrando que um dia dançamos embaixo dele. Quando, sem mais nem menos, olhar para a lua e ela cintilando em cima de nossas cabeças, porque sabemos que ela também está sobre minha face. Quando sentir um cheiro de champu. Quando comer Passatempo. Vai se lembrar de mim com cara de sono. Vai se lembrar de mim com algum café na cama. Em noites chuvosas vai se lembrar de mim. Da minha voz rouca, do meu sussurro no telefone, da minha breguice. Vai se lembrar de mim quando sorrir e pensar que eu adoro esse sorriso com buraquinhos na bochecha. Vai se lembrar quando tiver netos e falar que seu primeiro beijo pela web foi uma coisa ridícula e linda. E vai se lembrar de mim quando seus pés tocarem a areia da praia, morna e úmida. E quando os passarinhos cantarem e os leões saírem da jaula. E quando quis fazer Amor comigo. No sofá amarelo ou em qualquer canto desse mundo estranho. Quando desligarem depois de você falar alô. Vai se lembrar de mim quando comer amora e lembrar a cara simpática que ela tem. Vai se lembrar quando as nuvens passarem pelo céu. Quando o cheiro de flores invadir o seu quarto. Quando essas palavras ainda fizerem sentido e você, bela, única e encantadoramente com olhos brilhando, sentir no seu coraçãozinho que um dia você foi minha.

10

Agora o céu e o sol nos banham. O ar que respira é o mesmo que o meu. Fico quieta, intacta, esperando o universo se acalmar. Escrevo cartas, palavras saem da minha boca. Meus olhos começam a brilhar com uma naturalidade de criança. Meu coração ainda suspira, leve e com esparadrapos amarelos. Continuo a ver o céu. Tudo passa muito rápido e lento para eu sentir. Se eu morresse amanhã estaria feliz. Mas ainda espero. Não tenho tanta pressa. Ainda espero no fundo escuro desse mundo que algum pássaro, alguma rosa cintilante suspire e a naturalidade dos olhos dela, meio inocente, meio animal, encontre as minhas de criança.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Final de outro ato. Onde começou?

não entendi onde se chega com tudo isso
em qualquer lugar que seja
e chegamos aqui
e cheguei aqui
em círculos como sempre
me leio
me vejo cada vez mais
um não sei o quê

não entendi onde se chega com tudo isso
não basta meu coração dilacerado?
o que mais se quer?
o que mais?
um pesado pé imenso
gigante
pisou-me
e me senti esmagada
com esse sorriso irônico
malvado
com ódio e riso
fiquei intacta
como sempre costumo ficar
um gelo

não entendi mesmo onde se chega com tudo isso
com toda essa ironia
com toda essa demonstração ridícula de afeto alheio
acho que a partir daquele momento
laços se desfizeram
não por mim
por uma realidade invadida
por um fio irônico
que fez questão de repetir
onde não você era a vítima
mas eu
enforcada, pisada e esmagada
quando não te pedi absolutamente nada
e você me veio com tudo
e mais o tudo que ainda faltava

decidi que o sol vai brilhar
sempre
e não me permito continuar sozinha
porque você me bateu na cara tantas vezes
como não percebi isso antes, meu Deus?
não faz sentido continuar sozinha
você me recompensou em dobro
toda essa ironia
essa dor
angústia
pra quê? você não está feliz com isso?
o sol está brilhando tanto pra você
sabemos muito bem
enquanto, depois de eu ter tentado tudo
você não se importou
e agora tenho tanta coisa intalada

mas nao importa, amanhã ou depois eu melhoro
quem sabe
sim, amanhã.
hoje ainda, talvez.
Coisas boas e ruins passam
sempre passam
e virão outras e passarão outras tantas
pra perder
pra doer
como sempre foi
como sempre será.

não entendi onde se chega com tudo isso
mas amanhã eu melhoro
quem sabe hoje.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Sorriso imenso de beira de estrada ao chegar aqui

É isso. Pronto.
Há coisas que devemos decidir por nós mesmas.
Pensamento alheio. Off agora.

Deixa-me contar o sorriso. O meu sorriso.
A viagem toda vim olhando a estrada. Tantos anos fazendo o mesmo caminho e todo final de semana a mesma coisa. Nunca havia percebido tamanha beleza. Em meio à mata aquelas casinhas rústicas. Uma nostalgia me bateu na porta. Mas o céu estava lindo e azul. Eu tenho um derretimento por céu azul. Mas o mais bonicto, além do azul intenso e as nuvenzinhas brancas, era o contraste que ele dava com o verde da mata. E de repente aparecia outras casinhas, uma muralha de pedra. Nunca fui tão feliz numa viagem de volta pra Tatuí.
Tirei meu tênis, estiquei meus pés lá no alto. Me senti acolhida por uma bolha gostosa e aconchegante. Dormi só um pouquinho, o que é bom, porque costumo dormir a viagem inteira. O costume atrapalha nossas vidas. É difícil olhar depois, quando você acha que ja olhou tudo.
Estavamos perto, reconheço a estrada, fabricas, loteamentos, ceramicas, ferros velhos. O sol nos giuando. Entramos na cidade. A avenida, os bares-botecos, uma oficina ali. É no alto, então da pra ver uma boa parte da cidade, principalmente a fabrica de tecelagem velha e abandona, que eu nunca entrei na minha vida. Um dia eu entro, com certeza. Lugares velhos, abandonados e emepoeirados me chamam. (seria eu um lugar velho e empoeirado?) Vai o onibus subindo avenida, passando pela praça da Concha Acústica. Avistei uma menina que estudou comigo, que agora mora em São Paulo e faz dança. Linda. Ana Cláudia. Nunca mais nos falamos. Ela subiu e o ônibus virou. Logo a praça do Junqueira. Cesário Mota. A praça que costumavamos ir beber vinho, eu e os meninões, na nossa adolescência rebelde. Continua, atravessa a rua onze, uma rotatória, o conservatório, meio vazio, e chegamos na rodoviária. Calcei o tenis, sai, morrendo de sede. Chegando ao bebedouro avistei uma senhora com carrinho de sorvete. Corri. Ela atendia um rapaz, mas não escutava o que ele falava - eu não escuto o que voce fala, fique a vontade aí pra procurar... - e falou a mesma coisa pra mim: ... oia, tem de leite aqui, ali de frutas, pode ficar a vontade, viu?. Obrigada, respondi sorrindo. O rapaz tinha levado dois picolés de limão. Eu procurava um de groselha, mas não achei, nem me esforcei pra procurar mais fundo. Peguei um de côco. - tchau, obrigada, disse à senhora do sorvete. Era tudo o que eu precisava: um picolé.Não quero mais nada, ah não ser isso, poder admirar tudo, como se nunca nates tivesse visto. Subi a rua XV. Um sol, um calor, meu picolé de côco, todo branco e reluzindo. Doía nos olhos. Decidi não ir de ônibus até minha casa. Já fiquei sentada muito tempo num ônibus. ( um pra ir até a Barra Funda, outro pra chegar em Tatuí). Por isso, resolvi pegar a moto. Subi a rua XV, passei na frente do cinema e estava cheirando pipoca de cinema ( porque pipoca de cinema é diferente da pipoca que se faz em casa). Parei para ver o que estava em cartaz, apenas dois filmes. Um desenho e outro sei lá o que no metro. Toda alegre decidi que hoje iria ao cinema, quem sabe sozinha, quem sabe convidaria alguém, não sei, ainda é tempo de decidir. Pessoas andando pela rua e eu os saudava: Olá, povo tatuiano, estou de volta. Quem seria você? - alguém me perguntaria se me ouvisse. SOu eu, a Cássia, acabei de chegar de São Paulo, mas moro aqui. E então sorrindo o cidadão tatuiano me abraçaria. Povo tatuiano. Sorri muito, o caminho inteiro, tomando meu picolé. Durou acho que, três quarteirões. Cheguei atrás da igreja e joguei meu palito ali numa muretinha. Eu nunca faço isso, mas hoje resolvi joga-lo. Logo após tinha um carrinho de lanche e percebio que tinha um lixo. Burra, pensei, o que custava segurar o palitinho ate agora? Dane-se, joguei mesmo. Passei pelo carrinho de lanche do lado do Unibanco, e havia muita gente ali. Nesse calor, nesse sol, voces comendo um puta de um lanche. Oh. E eu estava com fome, mas fome de outra coisa. Cheguei no escritório onde o meu irmão trabalha, apertei a campainha, duas vezes e ele apareceu. Pedi então que ele me desse a moto. Disse que sim, se eu o fosse buscar às 5 e 30 da tarde. Sim, respondi sorrindo. Peguei o capacete, a chave, o documento e o controle do portão e fui. A cidade cheia de gente, eu e minha moto. Fiz o caminho que costumo fazer, indo por cima, pela Nova Tatuí, porque é um caminho mais bonicto e posso correr mais, sentir o vento no cabelo ( ou o cabelo no vento?) . É uma avenidona enorme que eu costumava fazer minhas caminhadas, mas ha tempos que não faço mais, agora só passo de moto ou de carro. Corri. Um pasto grande, algumas casas, o cééé azul. Que lindo. Respirei fundo e olhava-me no espelho para ver meu sorriso, porque era muito bonito, não posso negar, minha felicidade foi bela. Correndo com a moto comecei a cantar alguma música. Passei por aquela árvore que sempre adorei. É uma árvore bem grande, e parece árvore cinematográfica, por que em dias nublados ela fica muito bem. Ela é seca e eu nunca a vi com flores ou folha. Até hoje. Surpreendi-me e até voltei minha cabeça pra trás para ver se era verdade: a árvore estava mesmo com folhas. Continuei correndo e sorrindo. Um muro novo ali naquela empresa, ai que chato, pensei. Virei, passei em frente a polícia, virei de novo e peguei a avenida mais vazia que eu tambem adoro, a rua deserta onde tem uma ceramica velha ( que até hoje não sei se é abandonada). É uma rua que dá para os pinheiros. Eu sempre faço esse caminho e ele é sempre muito bonicto. Cheguei no meu bairro e fui pela rua do ponto de ônibus, na esperança de ver a menina do ponto de ônibus. Nada. Nunca mais a vi. Que pena, ela me sorria lindamente, e os sorrisos sempre me derretiam. Como se nos conhecessemos há muito tempo. Desde a primeir vez ela me olhou muito lindo e então passei a retribui-la com olhares e sorrisos. Por onde andas, menina do ponto de ônibus? Há dias que passo e nunca mais te vi. Apareça, mande carrta, mande um sorriso, por favor. Olhe pra trás quando passar por mim. - Não a vi. Dessorri por um momento. Mas logo cheguei em casa. Minha casa. Entrei correndo porque precisava muito fazer xixi, e esse é um problema que tenho. Fico desesperada, não consigo achar a chave, preciso sentar e respirar. Abri e entrei. Um frescor de casa minha invadiu-me, bateu-me no rosto, no cabelo, os pés, o nariz. Invadiu-me. Abri todas as janelas pra deixar a luz entrar, como ela deve entrar, me iluminando. Estou tendo momentos agradáveis com iluminação em geral. No jardim que não é um jardim, que dá pra janela do meu quarto, nasceu uma planta e agora ela está florindo. Florzinhas pequenas e arroxeadas. Vou falar para não a cortarem. Preciso plantar algo ali. Um pé de amora? Seria lindo. Cerejeira? Também. Rosas, copos de leite, tudo tudo tudo. Vou plantar meu sorriso que cultivei a viagem toda. Vou me plantar ali. Seria eu uma flor? Que nada. Admiro-as, de facto. Admiro tanta coisa. Agradeci mesmo por eu ter olhos e ouvidos e poder ver todas essas cores e poder ouvir músicas bonictas, agradáveis.
Agradeci por estar de volta. Agradeci por estar em São Paulo também. O que seria daqui se eu não estivesse lá? Agradeci por tudo, porque afinal, tenho tudo o que eu preciso. Não peço coisas absurdas. De vez em quando talvez, é bom sonhar. É muito bom sonhar.
Tomei um banho ouvindo música bem alto, como sempre faço. Corro pela casa, danço, faço careta. Vim escrever, porque eu precisava dividir isso, meu empoeirado quarto, e ninguém melhor do que você prame ouvir. Nada melhor do que eu mesma pra saber das coisas. Senti um egoísmo ai. Você também, né. Estou assim hoje. Acho que vou mesmo sozinha ao cinema. Não é que eu nego as pessoas, elas me negam, então não faço muitas questões de algumas coisas. Na verdade eu tenho preguiça. E ver o que é belo não custa-me nada. Acresceta-me.
Atémais vê-lo, senhores. Senhoras, me desculpem, mas hoje estou pra mim. Hoje estou pra Tatuí. Quem sabe amanhã. E vai indo que eu não vou.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

"eu vou ficar esperando você numa tarde cinzenta de inverno bem no meio duma praça, então os meus braços não vão ser suficientes para abraçar você e a minha voz vai querer dizer tanta coisa que eu vou ficar calada um tempo enorme só olhando você sem dizer nada só olhando olhando e pensando meu deus ah meu deus como você me dói vez em quando"

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Momentinho II

Comecei a ler algum conto do Caio F. Abreu, mas não consegui, a densidade dele está diferente da minha. Minha densidade agora é clara e bela. É uma boca cheia de sorrisos. Sorrisinhos lúcidos e brilhantes. Não consigo traduzir tudo ao certo. Só sendo eu mesma para saber.
Mas deixa eu te falar uma coisinha:
capelinha de melão
é de São João
é de cravo
é de rosa
é de majericão.
É só isso. Breve e alegre. Breve e alegre. Como tudo na vida.
ai ai ai ai ai ai ai ai ai ai ai ai

Vazio Gostoso

Obrigada, clara manhã, o essencial é viver

Uma alegria engraçada, de ficar sorrindo feito boba. Andando pela rua e buscando na memória músicas antigas e alegres.
Vida cheia de mudanças. Pândega essa vida, se não fosse irônica. Não acha? Acho um pouco. Mas a ironia tem diminuido aos poucos, e isso é bom. Volto a reinar em mim. Livre arbítrio zero.
Que seja. O fato não é esse.
Cheguei em São Paulo segunda-feira à tarde e vim direto pra faculdade. Estava sem a chave do apartamento ( um amigo meu havia perdido) e combinei com a Arielli de me esperar para irmos embora juntas. Agora moramos só eu e ela. As gêmeas saíram e foram morar no prédio ao lado, com o pai.
Fiquei uma semana fora, mas ainda lembrava de como era o apartamento e de como era chegar em casa e entrar bem quietinha porque as meninas já estavam dormindo e e eu tinha de vagar com as luzes apagadas. Bem, cheguei em casa segunda-feira e o apartamento estava vazio. Vazio de tudo, pessoas, móveis, som. Eu e a Arielli. Falavamos e o som ecoava pelo apartamento todo. A maioria dos móveis que tinha era das meninas. Mas essa é a melhor parte. Não temos nada, televisão, computador, micro ondas. Na cozinha o essencial que é um fogãozinho e uma geladeirinha. Temos o essencial e o que ficou foi ( além do nosso quarto inteiro) um sofá amarelo com algumas almofadas, uma mesinha, uma vitrola e uma caixa com discos de vinil ao lado. Meu Deus, como eu não descobri isso antes? Que maravilha, senhores. Chegamos e deixamos rolando o disco do Chico enquanto conversávamos atoa. Eu sorrindo igual boba, tudo vazio, um vazio gostoso, limpo, calmo. Temos tudo que precisamos. Uma vitrola e discos e um sofá com almofadas. O que mais eu quero? Achamos pizza na geladeira e comemos. E eu sorria feito boba. Apartamento vazio.
Não sei, senti mesmo algo muito gostoso dentro de mim, me purificando, me deixando inteira, sem me perder em outras coisas aleatórias. E esse enxuto me fez parecer mais livre. Era a música que faltava, era olhar o outro.
Ontem cheguei sorrindo de novo, louca para sentar no sofá e ficar olhando o teto deixando o disco rolar. Porque vitrola deixa o ar mais sofisticado. Fiz um miojo, estiquei meus pés e lá vai o disco rolar: Willie Nelson. Nunca tinha escutado. Só ouvia esse nome na música dos Engenheiros do Havai, mas nem fazia ideia de quem era. E ouvi. Um country antigo, que faz você viajar por todos os lugares, aquela cena árida e amarela, um sol alaranjado, você, um calor no seu corpo. Viajei sozinha e me senti feliz de novo.
Um sofá e um disco tocando. Eu disse que queria agora uma máquina de escrever. Já que estamos nessa onda retro, antiga e deliciosa. Acho que é a única ambição atual: uma máquina de escrever. Na verdade foi algo que sempre tive vontade de ter. Coloco ali na mesinha onde ficava o computador, acendo um cigarro que não fumo, um vinho barato e deixo, como sempre, as palavras virem. Não é delicioso? Me diga. ( Até me lembra Nelson Rodrigues)
O apartamento está vazio e ecoa as palavras pelos cômodos, do chão ao teto. Deixo a música tocando e fico dançando na frente do espelhinho que uma das meninas deixou. Já é tarde da noite, estou de pijama, descalça, e canto o que eu nunca ouvi. Faço caretas, me divirto comigo. Me acho linda. Me acho linda e engraçada, porque me pergunto às vezes: o que você ta fazendo ai, hein? vai dormir, menina. Que nada. Deixa-me aproveitar a vida. É o meu jeito de aproveitar a vida. Caretisse. Cássia, como você é engraçada. Dançava desajeitada, tentava plantar bananeira, a mão deslizava. A capoeira está fazendo efeito. - que diabos eu pensava quando entrava e estava tudo apagado, cheio de gente e tão vazio - parece que eu explodi ali dentro.
Maaaaaaas
oooooo
vazio
um sofá
uma vitrola
no vazio
mais gostoso
que eu dancei
dançava
bailava
o cabelo gigante
armado
a noite calma em plena São Paulo

bailava
só no som do disco

bailava
só no sofá

meu pé bailava
no eco
no vácuo
no
v
a
z
i
o

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Momentinho

Um não sei o quê aqui dentro.

Cássia, querida

fada, princesa, colombina

cadê

vontade louca de doer de alegria

que estoure tudo

a vidraça da praça intacta

a vidraça do seu sorriso

mas é uma alegria contida

serena

deixa eu viver e respirar

serena

calma

um alegria que me diz que o dia está azul

e estar azul é uma coisa muito boa

Mais uma semana: coisa boa de doer

'Tenho agradecido por estar vivo e ter andado por todos os lugares onde andei e ter vivido tudo o que vivi e ser exatamente como eu sou.'


Mais uma semana se foi. Há coisas que não se explicam, que parecem fracas quando traduzidas em palavras. Mas é o que vou tentar passar um pouco. De quanto tudo foi tão gostoso. Foi tão mágico. Uma comunhão agradável entre todos os que me acompanham, me acompanharam, e mais uma vez o destino nos colocou juntos.
Aprendi muita coisa. Reflecti outras. Revivi outros sentimentos, alguns fracos , um tanto apagando-se. Alguns outros muito vivos. Aquela chama ardente de sempre. A chama que precisava ser activada de novo. Minha energia recuperada. Estou completa novamente. O mundo gira sem muitos propósitos e descobri que posso dirigi-lo. Posso mudar alguma coisa. Alguma coisa, entende? Interagir. Eu posso me renovar sempre, meu Deus, que coisa linda. Como é bom crescer, acompanhar esse processo tão doloroso dentro de mim.
Festival de Teatro. Um acontecimento que é esperado todo ano. E esse ano foi mais fraco, embora pareça eu tenha aprendido muito mais, eu tenha me enxergado em alguma coisa, visto de outros modos.
A Oficina de Direção, com o Marcelo Lazaratto, foi algo surreal. É além, entende? Foi uma parte do Teatro que eu não dava tanta importância. Mas agora pareceu explodir na minha cara. E uma concepção de Teatro, que talvez eu tenha deixado de lado, voltasse a reinar. A idéia de que nos prestamos para algo maior do quenos, entende? Meros instrumentos. E o resutado final é grandioso, que dá até vontade de chorar de lindo. Dá até vontade de voltar a atuar e começar a dirigir. Mas ainda é tempo. Sempre ' ainda e tempo'.
Ah, meus orgasmos artísticos. Repensei muitas coisas. Ainda estou processando tudo. Foi tão rápido. Uma semana, meu Deus.
Encontrei aquela menina de novo, minha eterna amiga, apesar de tudo. É tudo uma questão de posicionamento. Foi maravilhoso tê-la de volta. Não tanto do jeito que eu queria, do jeito que desejei de novo, irracionalmente, mas acho melhor que seja assim, talvez. Tenho um carinho imenso, pelo que fomos, pelo que somos e o que passamos juntas. Não consigo não achá-la linda. E ela continua usando o mesmo perfume, que eu tanto gostava quando beijava seu pescoço e o cabelo caía em meu rosto. Lembrei de tudo sim. O que você quer que eu faça? Foi inevitável. Mas eu, senhores, sei o que me foi dado. Sei o meu papel. E não me arrependo do que foi nem do que é.
Marcou-me muito esse contacto com meus amigos. Nos reunimos, todos. Embora tenha faltado muita gente querida que nos lembrávamos sempre. É lindo demais. DEMAIS, DEMAIS, DEMAIS. É lindo de se ver. E eu agradeço por tudo. Pelo que construímos juntos, pela nossa identidade e nossa bolha teatral maravilhosa. Sexta-feira nos reunimos para um churrasco. Conversamos sobre tudo, sobre o festival, sobre as peças, sobre psicanálise... tudo. Um churrasco. Vou dizer que churrasco sempre me remeteve uma ideia meio chata de pessoas que se reúnem para beber e jogar baralho, falar sobre futebol, mulheres e outras coisas fúteis. Mas a gente consegue ( e eu amo isso sempre) transformar tudo num ambiente mágico. Um churrasco artístico. Seja o que quer que seja. Brincamos de mímica, de mafioso e isso por altas horas. Tomamos sorvete, rimos e atuamos tão bem. Novas piadas interna, eu recuperando minha energia ( e eu precisava disso, você bem sabe, ó empoeirado quarto). Eu preciso de vocês.
Um vento muito bom soprou a nosso favor, a meu favor. E o universo tem sido mais ou menos bonzinho, embora algumas ironias ainda continuem e olho para o céu para ver: isso é comigo mesmo?
Foi tudo maravilhoso maravilhoso maravilhoso maravilhoso
Obrigada, Tatuí por existir e me fazer ter nascido no seu berço. E ter te conhecido desde pequena, nessas ruas finas de cidade de interior, e comido pipoca na praça da Matriz e tomado sorvete no Palácio dos Sorvetes. E poder ter brincado no coreto da praça. Vagar pela Avenida das Mangueiras e olhar a fonte que há tempo tempo ficou sem jogar água. Por ter desfilado no Onze de Agosto, quando criança, pela sua rua principal. Por ter conhecido suas escolas de arquitetura antiga que admiro tanto.E suas pessoas que te seguem, andam, os velhinhos no banco da praça, as pombas comendo milho. Pelo Teatro, onde, sem sombra de dúvidas, foi um marco pra minha vida, pra Cássia como pessoa, em crescimento, e por ter me feito ser o que sou hoje. O Teatro foi decisivo pra minha identidade, pra minha afirmação como pessoa, e meu crescimento pessoal. Foram três anos, que passaram( voando aliás) que me alimentaram de arte. E claro que não nego outras coisas. Mas a energia forte que isso tem é sem dúvida o que me alimentou até agora.
E não adianta, senhores membros do júri, pois eu vou sempre voltar pro meu berço. Seja o físico, o mental, o artístico. E eu vou mudar em muitos aspectos, mas é ainda mais saboroso quando se mantém aquele cerne de pessoa.
Estou maravilhada. Tenho que voltar pra minha vida. Fiz o que eu tinha de fazer. E vou sempre ter de decidir entre um ou outro. Mas quando se trata de se alimentar com coisas boas, tudo o que vier é válido.
Obrigada meus amigos. Obrigada ó grande obra prima. Ó Teatro, meu amor. Ó energia louca que me toma conta, me invade, me recupera. Obrigada pelo que fui e pelo que sou. Pelo que conquistei e ainda hei de conquistar. Obrigada.


- em eterna mutação, lenta e bruta. É preciso lapidar-se.

sábado, 17 de outubro de 2009

Meu cubo.

Um cubo roxo. Papéis espalhados, janela meio aberta. Livros. Nas paredes vagam ideias, fotografias e palavras. A disposição das coisas é o meu ser. E na minha bolha eu me encontrei.
O meu quarto me aconchega e diz que sou eu sempre quem o faz inteiro. Como uma ligação. Como se eu precisasse dele e ele de mim para que ativasse, muito além, uma energia única.Para que nos ativasse uma coisa bem boa, enchesse o peito, um tesão solitário, que explodisse as barreiras do real amargo e minha mente e meu coração pulsassem num ritmo estrondoso. Orgamos plurais, múltiplos. E eu reinava entre aquela bagunça.
Fazia um tempo que eu não ficava trancafiada no meu quarto tatuiano, roxo e cheiroso de um perfume meu, enquanto lia algum livro, enquanto admirava pinturas de livros de poções mágicas que eu roubei na escola, enquanto ouvia a Nona Sinfonia de Beethoven ( descobri que éo Hino da Alegria) e delirava entre o surreal, expressionista eu e minhas divagações. Quando eu ficava olhando para o teto pensando mil e uma coisas. E as frases escritas na paredes, com letras escorridas, me tomavam a ideia e me faziam me sentir inteira. Eu em um monte de palavras. É sempre isso. " Se de tudo fica um pouco, mas porque não ficaria um pouco de mim?" Pergunto-me quase que pra mim e pra ele ( o quarto). Porque não ficaria um pouco de mim? " Um pouco de mim em Londres" Um pouco de mim em Tatuí. Um pouco de mim em cada rua que andei, por cada pessoa que passei e me viu sorrindo, me viu chorando, me viu. E no meu qaurto ficou um muito de mim. É ali que estou. Escrita, fotografada, ouvida, pulsando uma vibração minha. É ali mesmo que me encontro e tenho certeza que sempre terei um lugar para onde voltar. Pra quem voltar. Sempre pra mim mesma. Cada capítulo, no final, eu volto pra mim. Que capítulo é esse? Pareço dividir-me em épocas. Não tanto. Mas cada dia aprendo uma coisa nova, uma descoberta óbvia e absurda que de tão óbvia e absurda me cegava. Olhei-me. O cabelo mais comprido, o cabelo bagunçado como s e tivesse acabado de acorda. O meu pijama, uma meia cinza. Tão eu, meu Deus. Que delícia. Que delícia. Me agrado tanto. Isso só quando não brigo e me maltrato.
E fico deitada na cama, um chuvisco la fora, alguns trovões, e eu a olhar o teto.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Pesa-me: leões, pássaros e o tempo

"... Sei que pretendia dizer alguma coisa muito especial pra você, alguma coisa que faria você largar tudo e vir correndo me ver..."
Senhoras e Senhores membros do júri, aceitem essa dor banhada de tapas irônicos da vida...
Dói tudo. Acabo ainda na sarjeta. Peito aberto, coração dilacerado. Porque sempre parece ser isso que me sobra. Eu.
Era a única decisão que eu tinha a tomar. Não me arrependo, afinal. Arrependo-me de saber dos factos. Não queria saber de nada. Fosse como fosse.
Eu não suportei, confesso, o facto de outro alguém, que não eu, beijar-te. E pegar nas suas mãos e ouvir a sua voz. E eu a ver navios, e eu... eu, sempre aqui esperando. Alguém bem pertinho de você, sentindo sua respiração. Meu Deus, quanta Crueldade. Marília bela...! Pudera eu ser quem te beijava, pudera eu ser quem te abraçava. Não aguentei. Foi demais. Como um prédio desmoronando no meu sonho. No nosso sonho. Não sei o que foi tudo isso, mas enquanto foi, foi muito bom. E se continuasse iria se tornar amargo, porque ainda sinto o teu gosto açucarado em mim.
Nunca vi, te juro, tanta crueldade e ironia como nesses últimos tempos. Esmagou-me e resisti até não poder mais. Era tudo, absolutamente tudo se voltando contra mim, como se eu tivesse a obrigação de saber sobre o que é o mundo. Sobre o que são as pessoas. Eu não aguento mais essa ironia, não aguento mais a vida me batendo na cara.
Eu choro porque é o que me resta. Fico a ler nossas mensagens, sua carta, seu cheiro que eu não tive perto de mim. Nada, meu Deus. O que quer mais? Já fiz meu papel, estou sofrendo... e agora? Eu tenho que esperar o que? Sua boa vontade? Vocês cansarem de brincar comigo?
Não sei quem eu sou nem quem eu quero ser. Se Cássia, se Sofia ou Valentina. Virginia Boba. Cássia Derrota. Cássia caída no meio da rua em pleno frio de primavera, nua... completamente à merce de quem passasse.
Deixa eu te falar, depois de ter falado um monte: não me restava mesmo outra coisa. Continuar? Continuar o que? Já não cabia mais nada e você quis enfiar outra pessoa nisso. Não te culpo. Eu me culpo. Não, não me culpo. Iria de acontecer. MMMMMMMMMEEEEEEEEERRRRDA. Ao menos, se eu tivesse você perto de mim. Porque foi essa distância que nos passou rasteira, nos matou. A insegurança e o medo. Em mim está tudo MUITO CONFUSO. É uma confusão imensa. E saudade e saudade e saudade... meu desejo de poder ter você ainda. Com tantas dificuldades... e eu mais uma vez vomitando e chorando esse texto de merda que é a única coisa que me consola. Sempre é isso que me consola, me põe nos braços. Vontade de ter você. Foi o que me fez acabar. E egoísmo. A todo momento me vem uma imagem que eu nunca vi de duas bocas se beijando, que não é a minha na sua. E isso me corroeeeu taaanto. Num dia cinzento, num dia chuvoso e frio eu tendo de ler toda essa verdade explícita na minha cara, me dando tapas, me fuzilando num paredão sangrento.
Não é hora. Sentimos isso a semana toda. Você há de concordar comigo. É preciso que eu me acalme, deito a cabeça no travesseiro que não divido mais com você, e ponho a me acalmar, pensativa, sobre o que devo fazer... mas é preciso continuar sempre. Eu não desisti de você. Desisti da situação atual. Talvez você não me entenda e me esqueça em meia hora. Brilho eterno de uma mente sem lembranças. E a gente poderia no final ficarmos juntas e correr pelo campo florido. Nada me parece claro agora. Absolutamente nada. Esses acontecimentos, me deixaram vulnerável. Maldita. Maldita ironia que me abre inteira, me estupra e me obriga a fazer coisas.
Minha cabeça está doendo muito. Dor de cabeça de quem chora desvairado. Choro de alguém que apesar de tantos choros, não aprendeu que parece ser tudo a mesma coisa. Mas no fundo não é a mesma coisa. A situação talvez, mas os corações não. Sempre me pegam em cheio, me obrigam a me jogar e eu sempre caio de cabeça no chão, quebro os dentes, quebro-me e tento me recuperar.
É uma miséria. São condições sub humanas. Você bebe bebe bebe e de repente se engasga.
"Deve haver alguma espécie de sentido ou o que virá depois?"
Sinto sua falta. O seu carinho. O seu SORRISO. Das nossas conversas até tarde da noite. Nosso Amor telepático. Nossos pensamentos sincronizados. O blues. Os vídeos que me passava. Sua carta e o desenho mais lindo do mundo. O passarinho e a nuvem. Se eu pudesse olhar nos olhos... eu te sentiria toda minha. E você me veria transbordando e molhando papéis. Não consigo não ficar vendo suas fotos e eu pareço mais idiota de confessar tudo isso. Mas ser idiota é o meu papel. Me exponho à minha idiotice, minha fragilidade, me exponho a mim. E a você, afinal.
Mas isso não quer dizer que seja o fim de tudo. É preciso conseguir ver, limpar os olhos...
"Eu acredito. Acredito no tempo. O tempo é nosso amigo, nosso aliado, não o inimigo que traz as rugas e a morte. O tempo é que mostra o que realmente valeu a pena, o tempo nos ensina a esperar, o tempo apaga o efêmero e acaba com a dúvida."
A eterna espera. Esperança que parece morrer e renascer.
Eu morro de ciúmes. Já disse que não suporto. E seja como for, traiu-me. Na prática... Que prática mais absurda...
Eu queria pedir tua mão em casamento. Fugir e ter só as ondas e a areia de testemunhas. Mas eu não posso fazer isso... que diabos que eu não posso fazer isso? O que me prende? O que te prende? Me fala... não deve ser tão difícil assim.
E é aí que a realidade me cai na cabeça.
Chega uma hora que você cai no poço e está um breu imenso. Negro. Noir. Mais negro que o fechar dos olhos. Chega uma hora que você tem que parar e tentar enxergar alguma coisa. Talvez eu tivesse levado isso a sério demais. Talvez você só quisesse mesmo alguma idiota que te fizesse piadas. Atoa. Mas eu NÃO SEI O QUE É. Sei o que foi. Mas ai meus olhos foram fechando...
não pode ser só isso, entende? Mas é o que está sendo, é o que foi, é o que me dói, porque eu estou morrendo de vontade de te ligar e ouvir sua voz gostosa.
Teresa... quantos apelidinhos bregas. Tão engraçadinhos. Que já me dá saudade.
Será que fomos nossas? Somos livres?
Senhoras e senhores membros do júri, condenem-me de uma vez. Não aguento pagar pena sem saber do que se trata. Xadrez, condenada à morte... que morte? se morremos a cada dia. E parecem anos.
Você é uma pedra preciosa. É. E eu queria falar tudo isso na sua frente. Eu posso?
Senhoras, deixem-me delirar sozinha agora. Senhores, peguem suas armas e cacem algum pato selvagem,
Teresa... eu gosto muito de você. E me perdoe ( mesmo às vezes e não me perdoando) - você é livre.
( mas algo insiste em que eu deveria ter feito isso mesmo)
( como muitas coisas fizemos achando que era certo - ou melhor, achando que tinha de ser)