segunda-feira, 17 de outubro de 2011

nem eu me reconheceria
se me visse assim
é que você nunca
mais me reconhecerá

nunca de nunca de nada
eu acordei e ainda sinto
um gosto amargo
um fel
na boca

era a vida

nihil

chegou num ponto que percebi minha total niilidade
minha descrença e, digo um pouco mais, minha desesperança
percebi que não tenho muito no que acreditar
e um vazio me tomou por dentro

- você sente esse vazio? - perguntei
- sinto.

e eu não havia entendido como alguém sabe que se sente vazio
por não acreditar nas coisas
todo meu brilho da manhã havia sumido
todo o tédio insuportável bateu em minha porta
e eu cai, inteira, por terra.

essa chuva que não pára nunca
tá tudo seco e molhado aqui dentro
estou úmida, chorosa

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

ninguém nunca sabe o que é verdade em você
mesmo você gritando

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

às vezes
um feixe de luz me dá esperança
às vezes um feixe de luz
me dói demais
e me cega
às vezes renego a arte
como renego um remédio de depressão

nunca tive, talvez vestígios
mas se não fosse isso
de escrever e fotografar e poetizar tudo
eu estaria internada
num sanatório
numa casa de recuperação
e às vezes vejo o quão forte eu sou
mesmo sendo tão frágil
diante a vida

sábado, 17 de setembro de 2011

às vezes não sei onde colocar as minhas coisas
tem muito de mim
e metade se perde
é mutilado
tudo me cansa
as pessoas, a vida, o céu, o sol de tão lindo
a saudade, eu mesma
a rua, a fotografia, as insinuações
a literatura
a poesia
a dor o doce
o sal o óleo
minhas teorias caídas
minhas visões tortas de mundo
meu tempo dilatado corroído
tudo
ontem acordei como quem acorda
sem muitas esperanças
ontem ainda mudei de humor muito rapidamente
fiquei efusiva
cantei e conversei sozinha
como alguém que tem amigos imaginários

achei saudável
ela havia desaparecido
e só lembro dela quando
estou mesmo na carne viva de solidão
e ela mesmo me puxando a orelha
não me julga nunca por esquecê-la
e amá-la
amando a mim mesma

eu talvez não goste muito de me encontrar cara a cara
momentos de me suportar
mas é preciso
é preciso e eu vou até o fundo do poço
sempre

são muitas pomadas, gripe, dor de cabeça
sem pele
sem coração
meu cabelo está grisalhando
e poucos são meus anos
mas muitos quando penso
em mim pequena

não temos o direito de ser cruel com ninguém
nem faca, nem pudores decaídos
lilases os céus
e laranja no fim da tarde
nem o céu tem direito de ser cruel com ninguém
temos apenas que nos conviver
estamos no mesmo barco
não há ódio que se explique
mas há ódio que existe sim
há amor que existe
e nunca o explicamos
não é porque se é bonicto ou
tem o beijo macio e um sexo
muito bom
amor não se resume a nada
pode cair toda a cor das nuvens
e toda minha pele sair queimada
(ando queimada da vida)
podem escrever milhares de citações
mas digo
o amor não se resume a nada

o amor não se explica
a vida não explica
tudo dói
estou pairando na vida
nada o que fazer
apenas a tememos
talvez mais do que a morte

a morte resume todos os meus medos
e choro de noite molhando o travesseiro

suspirando
a falta de ar é muita
choro de inchar os olhos
choro de virar a fronha ensopa
e tornar a molhar o outro lado

sinto que não pertenço a lugar nenhum
não tenho família
nem amigos
nem amores
o meu pai está morto
e não o deixam descansar em paz

às vezes tenho muita saudade dele
e é uma saudade boa
um sorriso guardado no coração
às vezes fico mais perdida
porque a saudade dói
no sorriso que não tenho mais

a saudade é algo que dói muito
e nunca sabemos lidar com isso
por isso sempre tento ser serena e calma
tudo bem, vai passar
e não passa nunca
uma saudade eterna de alguma coisa que eu não sei

de um tempo que me parte
e parto sempre pra longe dele
me estraçalha
um tempo irônico
de querer estar e não poder
e quando posso já não é mais o mesmo
já não sou a mesma
ou sou a mesma desde sempre
intacta
parada

eu acho que podemos amar os outros
os outros são outros que me fazem ser eu
eu acho que podemos amar sim
e isso não pode nunca doer
amar até doer
amar e amargar

e eu amo, menina
amo
talvez não deixe nunca de amar as coisas
talvez não entenda nunca o que é amar
talvez não entenda nunca o que é saudade

eu amo e fico desnorteada
confusa minha cabeça
cheia de alucinações
meu coração todo partido
como corpo de caneta trincado
de tantas mordidas

ultimamente
tenho muita preguiça da vida

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

mês oito

o mês de agosto pra ser tomado com chá bem quente
a pressa queima a língua
arde toda
o dia todo
e ainda no outro dia

o mês de agosto problemático
pulmão asfixiado
ao gosto de quem
nem bombinha usa
e se recusa
acha que é droga
acha que é nada
a vida
diante de tudo

o oitavo mes de doer
a coluna
o coração
a orelha
a língua
de passar olhando o teto
chorando na cama
enquanto ve as sombras da janela
projetadas pelo farol de algum carro passando

e passa
daqui a pouco é setembro, dezembro
natal, ano novo
e agosto
de novo

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Nenhuma citação

começo encontrando um pêlo de cachorro na minha blusa preta, mas isso não tem a ver com o que direi em seguida.

Garoava. As pessoas são como livros. Só a descobrimos se as lemos. Caso contrário, nada sabemos delas, estão sempre fechadas, não existem.
Muitas andando pela rua, enquanto eu, encostada numa parede no ponto de ônibus, as olhava com uma tal frieza de que nunca antes havia sentido. Eu amargava cada garoinha, entristeci, eu também era um livro fechado, eu me rabiscava por dentro... e ninguém me via.
Subia, com um colete de "save the children", uma moça, cuja qual, assim que olhei fechei ainda mais minha expressão. Eu sentia que ela pararia pra me fazer perguntas, mas sei lá, não, não, essas pessoas são chatas, eu nem havia salvado a criança que estava em mim ainda, ou nem havia matado de vez todas as teorias acumaladas durante essa vida curta, de repente senti uma raiva dela, ela me abordaria, não era o momento, a garoa garoava e a moça andava um pouco rápido quando, eu com medo de olha-lá, a olhei nos olhos e ela sorriu pra mim. Ela sorriu pra mim. Ela me leu naquele momento, meus olhos se encheram de garoa, meu livro todo se espatifou no chão virando as páginas ao vento, molhando, derretendo... e passou.
A olhei de costas, ela não viraria. Eu queria correr atrás dela, me salve. Talvez eu tenha sido a única criança que ela tenha salvado realmente na vida. Só por uns instantes.


De resto, a vida ia mesmo como nunca imaginei que fosse, a gente nunca imagina nada do que é, o que parece ser mas não é, o não ser, o não parecer.
Eu não sei onde estou, e a cada momento não sei mesmo quem eu sou. Sou eu em relação a quem?  A mim mesma? A alguém? Aos outros?
Um cabelo longo e ruivo com uma máscara de médico na cara, de repente.
Que conclusões tirar da vida?
Eu era uma mar de perguntas, as respostas talvez viessem juntas, como o sal, mas ardiam.
- Alô! Acorda. Olha pra sua vida, a sua... o que é a sua. Não a minha, nem a dela.
É esse o problema. É isso que não está direito, se é mesmo que sei o que é direito.
Na verdade as duas dizem a mesma coisa. Na verdade eu já estava mesmo sozinha sem ninguém e assim eu acho que não machuco mais. Hoje, ao me enxugar no banheiro, tentei me imaginar num quarto de hotel de frente pro mar, sozinha, palmeiras, areia. Mas era o meu banheiro mesmo, com restos mortais de sujeiras alheias, uma coisa meio emporcalhada.
A essa altura talvez nem me importava se era metade ou inteiro, era o que sentia. Não entenda se não quiser.
Imaginamos tanto tudo ao mesmo tempo, só me resta meia hora.
não, o abstrato não serve, assim, de longe, sempre viveremos no abstrato mesmo tocando a pele.
não procuro ninguém, procuro a mim mesma. nem eu consigo imaginar anular uma coisa que é minha, mas ao mesmo tempo soou massacrada duas vezes por que gosto demais. e se eu odiasse?
todas as palavras estão me doendo como agulha
acho que mergulhamos todas num mesmo balde, e esse balde é pequeno, é pequeno pra tudo, nem eu sozinha caiba nele, preciso pular no mar
imaginamos imaginamos
escancarei todas as minhas páginas e agora elas queimam queimam no frio de inverno e verão nada definido. as folhas caem, como no outono.
ahhhhhh
é tudo uma massa amorfa
tudo é nada
a parte isso tenho em mim todas as teorias canalhas do mundo

domingo, 7 de agosto de 2011

hoje eu não quis fotografar as coisas belas
egoísta

Preguiça da vida

" ser poeta não é minha ambição
é minha maneira de estar sozinho"

assim que eu queria ficar, encostadinha solitária pensando em nada
em ninguém
talvez no mar
na brisa que vem do mar e salga sem querer o meu rosto
ou nas bicicletas passeando pela via
um lapis
um papel
tudo talvez que seja ordinário
tantos sonhos
a vida, a água de coco
essa menina saindo do banho
a beira do mar com conchas
sereia
ou borboleta
um beijo no ombro
minha maneira
de ter asas

sábado, 6 de agosto de 2011

Iniciação para Recuperar o Ar

Você sabe quem é?
Quem te divide ao meio
ou um terço
uma parte é sua
e as outras duas
quem são?
existem?

hoje sonhei com cabelos compridos
pele morena
que saudade
hoje preciso escrever tudo
evaporar toda essa coisa presa aqui dentro essa coisa que nunca sabemos realmente o que é se é se foi se vai se fica quantos ses e se não existem o ses as coisas só seriam e ninguem duvidaria e se meu nome é Graça ou Cássia

(ontem mesmo conheci a Graça, ela é negra e linda e tem voz grossa)

mas aqui por dentro pululam coisas estranhas e eu nunca nunca vou poder decidir podem os anjos e arcanjos pode o tinhoso me chicotear com plumas de avestruz pode de pena me pisotear e eu vou repetir com todo o grito do mundo
eu gosto de você
e
eu gosto de você
e esse ar vai sair de mim e entrar novamente como um recém nascido respira pela primeira vez e chora
todo ensanguentado e meu coração vai se abrir as arterias fluirão mais sangue meu pulmao vai se encher
esse silêncio vai explodir em particulas de luz radiantes do sol
pode ser que eu sofra ainda sem saber ao certo o que sou
talvez eu saiba o que eu sinto
não me julguem nem me condenem por não ser o que queriam nem seguir metodicamente uma regra social idiota e tão encravada no nosso âmago no meu também
mas eu gosto, gosto gosto amo gosto muito e morro de saudade e sonho à noite delirando
que agora nem posso chorar
se chorar eu pudesse
mas tantos ses não sei não fazem sentido nada faz
não sou nada
só sou alguém que gosta de você e de você
eu gosto
e aí você sabe o que
é
se é
se vai se fica
se foi se nada

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Nota do dia

palmeira não
pinheiro, pinheiro, pinheiro, pinheiro, pinheiro
palm tree
pipas pipas
passarinhos piando na garagem
pipas caindo no telhado
os pinheiros lá longe
longe
onde o sol se põe
onde morre o sol
pra noite vir
estrelada

nos pinheiros
não palmeiras
e as pipas
pipando o azul
enquanto o sol não se põe

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Lados

Um copo de resto de café
Quando gruda no fundo
Junta formiga
Mas nem mão amiga
que me tire desse amargo

Se era açúcar, de luz de poste
Laranja ou amarela
Quebrando a vidraça
Rebentando fibras
Queimando roupas antigas
Memórias feridas

Se era lindo o céu naquela hora
rimando as nuvens
Laranja e rosa
Marcando o infinito
Que pontos que nós éramos
Se eram nuvens
Se era chuva, vento
tempestade,
se era café no fundo do copo
ou era meu resto meio amargo
de mim mesmo
meu resto meio antigo
catando formiga
meu inteiro diluído
pedindo a benção
Se era eu

quinta-feira, 5 de maio de 2011

A Bola de Leite

Todas as vezes que eu e meu primo jogávamos bola no quintal de cimento da minha avó, lá pelos poucos anos nossos, a bola de leite, eu jogava no vizinho do fundo, e tínhamos a impressão que ela evaporava sozinha, de repente, assim que caía lá, pois era um terreno baldio e pasmados, ele mais bravo do que pasmo, procurávamos em vão a bola de leite mágica, sumida, abrindo um mistério interrogativo, sem mais brincadeiras, e íamos sentar no degrau com as mãos segurando o rosto, sujos e cansados.
Era o mistério da bola de leite. Das bolas, eram tantas que perdi. Que destino o deus das bolas dava a elas? Viravam queijo derretido? Pão de queijo? Bolas de leite. Foram trocadas por bolas de tênis que serviam para jogar vôlei com um varal se fazendo de rede. Aquilo era o máximo de nossa alegria, tardes e tardes descalços no quintal, jogando bolinhas de gude, bolas de tênis e de leite no fundo do terreno. Depois íamos comprar pão e tomávamos o café da tarde, o café bem docinho era o da minha avó, pão com manteiga ou mortadela, sem muito luxo, com muita alegria, com muita infância, a fome de infância que devorava tudo aquilo, devorava até a tristeza do sumiço da bola de leite.
E porque só eu era quem jogava a bola bem forte pra ela sumir? Nunca era ele. Ele se tornava quase que imune às imperfeções, o bom dos bons, mas eu gostava, gostava muito dele, ainda gosto, por mais que não o veja, e isso acabou se tornando, sem querer, uma boa lembrança do meu primo, com quem eu passei quase que minha infância toda, entre brigas e malvadezas, brincadeiras e conversas.
E são, na maioria, bem na maioria, momentos muito bons, que agarrei sem querer também com tanto carinho e guardo ainda, atrás da orelha uma história que o vento me conta, atrás da boca que sai sem querer. Guardo a infância, a velha, guardo a nova, cotidiana, essa, eterna.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Flocos Iluminados Rodando

Um som de piano de fundo, tocando talvez a Valsa nº 6 de Chopin, tocando mesmo, bem de fundo, os olhos meio acordando, as pálpebras abrindo. No céu escuro pontos brilhando, como fogos de artifício, flocos luminosos.

Capricho nº 24 de Paganini.- Rodopiando o corpo sozinho no meio da grande sala com chão de madeira. Soavam ocas as batidas dos pés. Quase um balé. E caindo, bem de leve, girava toda imagem à sua volta, numa mistura de cores. Brincava de dançar com os dois dedos da mão, o indicador e o outro, obsceno.
Se menina seria Olívia. Nunca me mostrou o rosto, mas ardia com seus pés nas minhas costas, as mãos no meu pescoço, balançando a cintura grudada na minha. Como era doce seu perfume, chegava a me enjoar, mas eu gostava, era ela, era dela aquele cheiro, só dela. Rodopiava me embriagando, entorpecendo já de um cheiro cítrico, misturado com suor doce, com valsa nº 1, com meus olhos cansados, ardendo do calor que ela soltava. Eu era um refén de sua dança. Era eu que a via mergulhada naquela bolha colorida, uma bolha de sabão gigantesca que cabia quase a sala inteira e diminuia, focando os olhos dela, que giravam e giravam e caíam, por um segundo, depois me olhavam, de repente, com violência, me atingindo selvagem, enquanto eu sentado, respirando fundo, já completamente embriagado, desmaiando.
Se menino seria eu, Thomaz. Nome nenhum. Tentando tocar violino, mas em vão, tentando tocar piano, mas meus dedos já caíam. Apenas ouvia o roído máximo dos pés tocando levemente a madeira, depois encostando em mim. Depois eu caía em cima dela e rolava por cima, ela, prendendo meus braços, uma onda com o corpo, encostava o nariz no meu, me provocando, e eu sorria, de canto, já entregue. A maneira como ela me olhava, me segurava e soltava, bem depressa, que eu nem sentia, estirado no chão eu ficava, o som agudo entrando na alma, no fundo do ouvido, me desequilibrando.
era um sonho, quase acordando, não queria. Olívia.
eram flocos iluminados de fogo queimando aquela teia que eu caí
na garra serena de Olívia, uma bailarina, uma coisa cor de rosa bebê, numa enorme sala com um sofá enorme. eu era pequenino, eu acordava.

domingo, 20 de março de 2011

Arame de Pão

Odeio gosto de pasta na boca. Me dá muita sede. E me pergunto porque sempre falo de coisas quotidianas, pequenas coisas, mas que existem e estão lá e fazem parte de mim, muito mais do que o naves espaciais tentando encontrar água em outro planeta. Haveria mesmo de ter água em outro planeta?
Bem, não tenho maist empo para hestórias pensadas, se é que um dia pensei em alguma. Mas as vivi, e tenho vivido tão intensamente que me falta tempo de escrever. Infelizmente.
Flocos iluminados rodando. Meu próximo título. Com licença.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Memórias Menstruais

Olha, eu até me acharia uma filósofa entrando assim em discussões existenciais, moralidades inúteis, vida trivial, escrevendo fragmentos digamos, quase românticos, se não fosse, por um momento, quando se abaixa a calcinha e vê que era tudo hormonal, era o meu sangue que eu dava realmente pra passar por tudo isso.

A música do caminhão de gás me entrou feito água pelo ouvido como quando entra pelo nariz e arde a cabeça. E era de manhã, minha primeira sessão no psicólogo depois de anos sem análise. De novo, pensei. O que falar? Não banque a espertinha. Que droga, meu fone estava todo embaraçado e a música do gás tocando, queria que fosse faísca e explodisse. Quando consegui desenrolar, o caminhão já tinha ido. Depois me perguntei porque pintam a calçada de cinza se ela já é cinza.
Não há nada nesse mundo que mude o meu espírito, nem mesmo o chocolate, nem mesmo o choro sagrado. Caminhando pela Paulista inteira, chutando pocinhas de água numa chuva fina de março, aquela multidão desconhecida, sem nome nem cara, a gente vai pela vida sem saber mesmo pra onde se vai. Esvai.
-Tem muita gente no mundo.
E agora, sem sexo nem cor, tomo capuccino sozinha sentada num bar café granfino, finésimo. Senhores e senhoras idosos tomando sua xícara de café com espuma e comendo seu croissant requentado falando sobre histórias de viagens pela Europa. Tudo derramado. Meia luz, assim, soando tão cinematográfica essa solidão. Não sei porque insisto se capuccino me dá enjoo, mas não, estou mor-ren-do de vontade de tomar. Uma puta xícara de capuccino com canela, tão gostoso, mas ânsia depois, que azia, sassenhora. Sem sexo nem cor. Malemá me masturbar à noite, diacho. Ai, que solidão destemida.

Sessões psicológicas são meio desconfortáveis. No fundo ouvimos o que já sabemos, só que cara a cara, é um pouco preguiça e falta de vergonha. Sim, no fundo do fundo mesmo é um medo incontrolável de alguma coisa que não existe, que está no passado ou no futuro, mas não agora. - Viva o hoje.
Vamos ao menos jogar dama? Quando eu pequena era jogávamos joguinhos infantis e era divertidíssimo. Quero a minha mãe.
(a ânsia continua misturada com fome, já é tarde, preciso dormir)
Só agora consegui, depois de muito tempo, escrever. Suspiro grande.

Dia absurdo de sexta-feira. Queria tomar um drinque com alguém, atoa, qualquer um, pela rua encontrado, e conversar coisas banais. - São Paulo está lotada de gente. Que tal um rodízio? - É pois é, nem desconfiei que eu estava na TPM. isso existe mesmo? - Se existe... quase me corto o pulso, uma loucura.
Mas o filme, sabe, com a JulietteBinoche, é lindo, lindo mesmo, mas eu não entendi nada. Sendo realmente muito franca, eu não entendi na-da. Fotografia linda. Olha, aquele movimento de câmera me deixou mais enjoada que ó, só de lembrar me vontade de vomitar. E é demorado, nossa, dói o pescoço. Cinema sozinha, adoro. Mas sem sexo.

Antigamente eu comia pra caralho. Era um doce atrás do outro. Bombom por cima de bombom. Marrom bombom. Gritava com a minha mãe, chorava deitada no banheiro, escrevia as mais profundas palavras, estava quase pronta para ser uma atriz com uma carreira linda. Pronto, desceu, sangrou, é chico. Tudo por água abaixo. Aspirações filosóficas não mais. A vida passa a ser linda de novo, o outono com seu vermelho friorentado, as pessoas belas. Um mês. E assim, indo. Vida bandida. Tristes borboletas sangrentas. O ápice do nosso auto encontro, para acabar assim, sorridente. Ou não. Ou aquele gosto amargo na boca, parecido com gás de cozinha, que insiste em azedar seus dias.

Não era isso exactamente, mas é o que tinha pra hoje. Já voltei à minha vida banal de mulher, de homem, de puta, triste, alegre, feliz pra caralho, de regime, comendo muito.
Enlouquecemos.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Eu sozinho

A cada momento infinito da vida
de arder de lágrimas os olhos no vento
a dor absurda de tudo
quanto é tudo que se vai

Não quis, talvez
mas nunca soube
a grande perda do
que nunca foi nosso
nem mesmo nosso eu
não se prende
só se aprende a doer
doer

Como foi ontem
e é hoje
e será amanhã
absurdamente cada dia
achando que o que te salavrá
são essas palavras rasas
escritas a tinta de caneta na parede
diluída
como se dilui o tempo
eterno num piscar de olhos

E você se foi
e um pedaço de mim foi com você
e ficou já o que não era meu
como uma mutação do que nunca existiu
mas sempre esteve ali, esperando
o momento pra nascer
como tantas outras que nasceram e morreram e se modificaram

Sempre o eu sozinho
apesar do outro

sábado, 5 de fevereiro de 2011

E eu que tinha apenas 17 anos

Primeiro um gole num copo de leite bem gelado. O copo suado deixa o círculo na mesinha, não gosto, limpo com a mão e mistura o pó com todo o vazio da vida. Era eu.
Nos anos que se passaram desde os meus dezessete anos tentei cobrir essa camada profunda de amor-falso-inexistente, que um dia, talvez por uma noite você tenha me causado. Mas foi golpe certeiro.

Quero tudo e mais um pouco da sua vida. Te sugo desde o momento que te conheci, aos poucos, mesmo esquecendo. E mesmo não querendo, o fio continuou minimamente ligado entre nós, de minha parte, infelizmente.

Sei lá, foi de repente. Hoje mesmo não estou muito bem, tudo soa niilista demais, as pessoas estão caídas nelas mesmas, as outras que não estão tentam cair em outras, uma porcalhada danada da vida. Nem sempre me parece tudo certo, aliás, quase sempre tudo parece estar torto, às vezes gosto disso tudo, do mistério de amanhã e por isso também caio em mim mesmo, por dentro, bem por dentro, agarranhando o pedaço de tripa que ainda falta contaminar.  Uma angústia presa na garganta, de sentar e chorar com minha avó, que deixa transparecer a quase lágrima que cai do rosto tentando escondê-la. É nítida sua preocupação. Tempos de angústia.  Sempre foi assim, mesmo antes dos dezessete.

Acontece que antes meus amores eram outros, e eu ainda nem sabia se ia mesmo um dia te ver, nem sabia depois se sobreviveria a isso. Confundo tudo com restos do passado e livros empoeirados que li. São histórias que se cruzam, nem sei mesmo se foi comigo, mas foi aos dezessete, meses depois, uns dois ou três e nada mais. Digo, e tudo mais.  Depois não fui o mesmo: chorei adoidado debaixo do chuveiro, senti teu perfume nos outros cangotes, beijei de mentira outros olhos para relembrar o seu não-acto, sempre quis, sempre quis que me beijasse os olhos, desvairei noites inteiras sem dormir babando nos restos de lembranças dadas por você, um chaveiro, uma pulseira, as cartas, teu perfume evaporando dia-a-dia e agarrando-se mais e mais no meu pulmão, te respirando como um fantasma, um miserável fantasma infame. E era eu que me dilacerava.

Tantos anos. Tanto nada respirando em mim. Me pego com fotos suas e me dói saber que você nunca, jamais, nem ao menos cogitou de me amar. E ainda, depois de tanto tempo prometi a mim mesmo que te esqueceria, te sacrificando num ritual bacaca de palavras mínimas. Inútil. Guardo para mim. Talvez um dia  ainda te veja, ouça sua voz de moça formada, sim, já moça mulher, olhe com carinho e ódio tua face clara, seus lábios carnudos. Eu era uma criança apaixonada. E você um dragão branco que me queimou com teu fogo. Daria no que tudo isso? Bem sabíamos, desde o começo. Agora aqui, esse cachorro batendo as patas no meu joelho, implorando atenção, como imploro agora, a ninguém, remoendo o leite que esquentou no copo, faz muito calor, um sol de danar lá fora, céu azul. E embaço com essa escuridão dentro de mim, exorcizada aos trancos, porque é preciso se encontrar, mas acontece que me perdi ao te relembrar no fundo da poeira da memória, do porão das lembranças, e me assusta saber que foi tudo guardado às pressas, sendo que poderia ter sido jogado fora.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Deitados entre os rododendros

E que por dentro de tudo feio que a gente via, tinha o mundo maravilhoso que escolhemos a dedo, feito por pessoas e momentos, danças e música. Amigos.

Eu ainda precisava fermentar toda essa alegria, pois só agora escrevo-lhes.
Vocês me deslocaram do tempo, fora do tempo, como diria Luiz, o mala. Demorei dias para me recompor, de um lado brilhando de sol e chuva, de outro as nuvens negras dessa tempestade real. Foi difícil encarar outras coisas, lembrar dos momentos lindos. Voltar pra São Paulo não foi fácil. E não queria deixar ninguém ir embora, mas sei que estamos juntos sempre, por essa força também fora do tempo, única, teatral que une cada um por veias de sangue perdido, como diria Chico. Eu te amo.

E só de pensar agora, quase choro, seguro o choro, estou sozinha. Não é feio chorar, nem de alegria, nem de felicidade. E derramei muitas lágrimas por vocês todos, quem estava e quem não estava. Choro de saudade, de lindo, de mágico. Choro feito boba, choro sim.

Nos batizamos no rio, ritualizamos com o vinho para Baco em volta de batuques e luz e tochas e cantorias, desejos todos sinceros. Fotografamos nossa intimidade meio envergonhada, dançamos numa lavoura arcaica, que cena, nunca me esquecerei, Kaline, menina moça morena, que encanto, me hipnotizou. Chorei largada feito criança que ganha um super presente de natal e você, ali, divina, rodopiando com sua maciez no cheiro de mata chuvosa menina. Que lindo.
E nos chateamos por momentos, e comemos coxas de frango e corações nossos, sempre entregues, e frutas a derramar pela boca, os pés em terra molhada escorregando, o gacto sempre sendo cultuado com seu mio clássico.
Dormimos juntos. Tentamos dormir juntos, mas a alegria é tanta que eu ria e abraçava todo mundo com meu sorriso.

Deus, me dê menos alegria.

Eu explodiria, me arrebento ainda, de tanta alegria, cada partícula que sai de cada um e me atinge, me dói, me ama.

Não queria dizer, mas essa coisa me faz ir, me faz querer sempre mais e esperar por vocês, como não espero tanto da vida, ah não ser sorrisos e abraços, amor, amizade. Carinho, beleza e arte. " mas essa lua, esse conhaque..."

E agora aqui, sentada, sozinha nessa sala escura da faculdade, barulho nenhum lá fora, choro ainda feito menina. Obrigada, deus-baco-dioniso-destino-teatro-tatuí-cada-um-de-vocês por todo esse pulso que me embala de alegria, por nosso reencontro, nossas descobertas, nossa ida e nossa volta, nosso círculo, vínculo teatral, de amor maior, de nós.

sem ironia: que bom que nos reencontramos.

e cada dia, cada Elaine, bacia com água e mato, cada pega de pé mole, são nossos passos que sempre voltam.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Dor e Cor

Quando seria para falar de minhas dores psicológicas. Nunca conseguirei escrever um romance. Talvez poesias, como Manuel Bandeira ou Drummonzinho.

Falta de ar crônica toda noite.

Em cima da mesinha há três algodões, um branco, um rosa e um azul bebê. Parece doce, mas estão jogados, prontos para receber acetona e limpar minhas unhas sem esmalte. Limpar unhas de esmalte azul acinzentado já saindo com o dente.
Queria lhe escrever notícias boas, de partir o coração de alegria, mas por hora é isso que tenho, pouco ar e pouco o que pensar. Meio alheia a tudo, esperando nada, vivendo como devo viver, tentando respirar, bebendo muita água e comendo porcarias. Engordei.

Não sei, mas no fundo talvez eu tenha um medo imenso de morrer, como minha avó. Ela morreu e eu também morrerei e tudo e todos, incansavelmente. Por chuvas e enchentes, por sol e seca, por comida ou falta dela, pelo físico e psicológico, cada coisa que me mata toda hora e quanto mais vivo, mais caio por terra. É a vida, meio crua e dolorida quando a quero ver. Não, não quero ver isso, mas é o que sinto no fundo.

Ao menos se eu pudesse lhe escrever coisas bonictas.

Ao menos uma coisa: O céu e seus fortes relâmpagos negros clareando o dia escuro, fortes barulhos, esperando uma chuva imensa, pedras, o vento forte na janela, quando se deita na cama, o corpo nu e quente e começa a chuva e chove bonicto que embala o amor e o sono. E depois vem o sol e o céu fica alaranjado e fresco como água caindo no pescoço, limpo.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

De dia na janela

O que a gente não vê e ilumina
todos os sons e cores
do dia-a-dia
a mulher passando
o menino jogando bola
a pipa
lá longe no céu
eram o mistério
revelado da vida