Não sou o leão com garras e presas, mas tenho o mesmo olhar predador. Ameaçador? Não sou esse lirismo louco de tempos modernos nem esse lirismo arcaico de tempos remotos. Não sei cantar e tenho a voz de uma menina de 12 anos no corpo de uma moça de 20. Mas continuo com a mesma luz infantil refratada no arco-íris da vida e seus momentos. O lilás suave de tom de pele encantada. O verde-floresta dos meus ares cheios de ar. E o som das águas rasas onde se põe o pé descalço para sentir a leve correnteza. Não tenho corpo de miss e nem nariz de francesa. Gosto de vinho branco com cereja e chocolate, mas de vez em quando tomo um pouco de cerveja. Eu bebia vinhos baratos no coreto da praça. Eu não tenho pele de seda, mas sei senti-la com cheiro de flores e maciez suave de pele de menina. Não sei escrever poesia, porque acho que isso não cabe a mim. Mas eu tento. Não sei escrever romances por que isso ultrapassa-me. Mas eu tento. Não sou flor-que-se-cheire, mas sei sentir o perfume delas quando elas se abrem e me deixam anestesiada. Um beijo. E se eu soubesse abraçar abraçaria todo mundo que necessita de um abraço, inclusive eu. Se eu soubesse abraçar pagaria minhas dívidas com abraços mais sinceros e menos desconfiança. Eu não sei cantar. Mas eu tento. E tenho voz de quem canta no chuveiro engolindo água. Canto dançando e descendo pelas escadas, imaginando um musical. E ninguém me vê. Ninguém me olha. Porque eu não sou dessas que se olham. Não tenho beleza universal e meu cabelo é sempre armado assim mesmo, com ar-de-juba-de-leão e meio despontado. Não sei cortar cabelo mas tasquei a tesoura na minha franja. Tenho espinhas e falo muito palavrão. Mas sei apreciar o valor de cada palavra doce, como 'pudim', por exemplo. Não tenho unhas feitas, nem vermelhas, nem de base, mas eu as corto e não as deixo sujas. Embora se elas fossem cumpridas e sujas eu teria de me aceitar com unhas compridas e sujas e isso seria talvez uma qualidade. Mas isso não acontece. Tomo muitos banhos e adoro perfumes. Sinto-os com uma elegância de tapete vermelho. Não uso salto alto nem me sinto confortável neles, embora eu ache maravilhoso. Pretendo um dia ter a loucura de usar um salto alto vermelho com um longo vestido. Isso será no dia que eu for pra Cannes. Mas eu também não sei fazer filmes. Actuar eu sei um pouco, mas não sei nada. Gosto do descompromisso com tudo o que soa 'obrigação'. Sinto-me arisca e até devo ser, no fundo. Não sou uma gacta-felina-de-capas-de-revistas, mas sou uma gacta-felina-que-toma-leite-e-ronrona-e-passa-as-costas-na-perna-do-dono. Sou alegre e sou triste. Geralmente sou muito densa e fico magoada se palavras duras em voz mansa me golpearem. Falo pouco de mim, mas escrevo coisas absurdas. Faço muitas perguntas. Talvez seja um dispositivo de defesa. Embora eu goste mesmo de ouvir as pessoas e acho que elas sempre estão dispostas a falar, mas elas nunca ouvem. Não há uma reciprocidade. E tenho paciência, mas atrasos me deixam nervosa e nunca sei se espero ou se vou embora. Costumo mandar mensagens e ligar. Mas telefonia hoje em dia nos quebra as pernas. Não sou muito (ou nada) adepta a política, mas acho que a Literatura tem seu papel em todos os campos da vida. Acredito em mim, mas tenho muita preguiça. Isso não é legal. E acho que posso mudar, se não me aceitasse desse jeito. Gosto muito de melancia. Bala de melancia, chiclete de melancia, suco de melancia, bebidas e afins e a própria melancia em si. Como até as sementes. São crocantes e têm um gosto suave. Gosto muito de Cheetos de cheddar em formato de lua. Aquele laranja forte. Bebo muita água o dia todo e consequentemente, vou muito ao banheiro. Passo a maior parte do tempo escutando música e pensando na minha vida. O ócio é muito bem cultuado. Não leio o quanto gostaria de ler, mas isso é uma questão de 'começar'. Sempre releio, afinal. Três ou quatro vezes o meu livro preferido. Lolita de Vladmir Nabokov. Humbert Humbert é um dos grandes caras que eu queria conhecer, mas no fundo teria medo de tanta ironia e mistério. Dolores Haze, vulgo Lolita, é uma ninfeta de 12 anos que, na minha idade, eu sendo amiga dela, acharia muito bonicta, mas enjoada. Mas bonicta. Não leio grandes coisas. Só o que me interessa. Pois ler o que não me interessa me pesa demais e isso me consome de uma maneira que nunca descobri. Tenho crises na tensão pré-menstrual e preciso muito comer doce. Choro muito e acho que não há solução para a vida. Só a morte. Mas cogitando que eu quero viver, a solução seria cotinuar vivendo na masmorra que é nosso coração e pensamento. Aceitando, afinal, tudo o destino nos prega, seja ele irônico ou bondoso, carcomido ou simpático. Sou chata, mas sorrio muito, sempre e morro de rir com coisas completamente infames. Sou sociável. Não sei falar em público. Acho que isso é uma trauma, no qual estou trabalhando muito. Enfrentar o medo sempre, na teoria. Na prática eu recuo e penso mil vezes se avanço ou se fico onde estou. Gaguejar, também. Mas são coisas que acontecem. Tenho uma paixão por muitas coisas mas uma moça me ocupa quase toda a cota. E isso são épocas. Tenho épocas. Tenho dores. Tenho olhos e tenho lágrimas e tenho saudade e sou uma criança. Sei dizer Eu te Amo, mas isso sempre me dilacera. Embora eu creia que sempre seremos dilacerados, de alguma maneira, então que seja do nosso próprio jeito torto e espinhoso. Doce e leve, muitas vezes. Gosto de mel e algodão-doce. Não sei me definir, mas tento.
E se pensar que não sou absolutmente nada disso. E não sou mesmo. Meus lados são sempre conforme a luz do sol. E uma hora me ilumina de um lado ao meio dia, e às quatro horas da tarde já sou iluminada por outro. Sou sempre eu nua e selvagem como costumo ser. Ou como não costumo ser. Sempre há uma desconstrução de tudo o que penso, pra poder pensar de novo. Sinto. E sentir tem me levado a lugares nunda dantes navegados. Nada. Apenas escrevo, achando que sou, afinal, minha própria sessão de psicanálise barata.
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