quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Fios sem Fim

Ao som de Paganini, Caprice n°5



Às felpas fiéis da minha roupa


Cravaram-me a unha no braço, como num insulto e tentativa de exercer algum poder sobre mim, ferindo os fios de tecido da minha blusa azul marinho, e senti-me como um mendigo chutado do canto da ponte. Cravaram-me depois a unha no pescoço. Não reagi. Olhei cabisbaixo e pensei: Quero meu cachecol.

Deixaram-me nú, ó meus senhores juízes, em plena luz do dia, em pleno deserto de mata urbana.

Nunca soube de quem foram aquelas unhas. Nunca soube quais pés me chutaram a bunda. Eu poderia muito bem chutar a minha e dizer: Vai, seu bundão. Mas não fui eu. Rostos e Silhuetas me passam como um vento e folhas caindo. Em cada um parecem-me representar alguma pessoa, muito além, parecem representar um sentimento. Desses mesmos que vêm com o vento, passa sobre você, bate, esfola, entra pelas narinas e faz você tossir, toma toda a sua corrente sanguínea, cada célula do teu corpo, depois sai, na mesma velocidade que entrou, como se fosse um rápido abrigo para manter seu calor, para manter seu ego. E quando não é um de cada vez, é tudo junto, um redemoinho. Depois passa um tempo enorme sem chuva, nemvento, nemfolhas. Uma seca. E as pessoas paralisam no ar, e muito mais, seu rosto esfarela e vira areia. Sua roupa, já molhada de tanto suor, é jogada fora. Agora você acorda, numa dessas madrugadas com ventania na janela, e vê que realmente seu rosto esfarelou.

Tudo se perde.

Como uma dança árabe-espanhola-italiana, ouso atravessar o deserto. Vejo ainda mais pessoas, agora a maioria mulheres, com panos longos vestindo os corpos, e eles dançam dançam dançam, como se fizessem isso pra sempre e estivessem fazendo desde que nasceram. Não consigo esquecer as unhas cravadas em mim. Passo a mão sobre meu pescoço e sinto ainda, marquinhas, quase sumindo, das unhas. Unhas. Palavra engraçada, né: unhas. u-nhas. U-N-H-A-S . uuuuuunhassss! hahahaha. Olha só o que elas podem fazer. rebaixar-te para níveis ínfimos de honra e reputação. E isso não é nada. Minhas próprias honras. Se é que me entende. Mas tudo isso comeu meu nome. Nem o amor mais me comia por inteiro, nem mesmo beijos ácidos e melosos de meninas lindas e encantadoras, nem meus olhos me viam mais. Mas as unhas... mas esse sentimento... mas essa roupa que ainda guardo...

Fui e entao estava já deitado num monte enorme de areia... é, desses que dá pra escorregar com um saco plástico. Caramba, eu me esfolava todo. Dei-me conta disso depois que vi meu corpo inteiro sangrando. Mas é ums angue bonito, esfolado. Nada desses jorros arteriais... pareciam ferimento de criança quando cai de bicicleta e machuca o joelho, só que era no meu corpo inteiro. Agora eu entendia a falta que a roupa me fazia... nada me importava mais, os sentimentos jogados fora, o vento nas células, os rostos e silhuetas, as dançarinas com vestes longas, apenas minhas roupas... e as unhas. Afinal, eu não estaria aqui se não fosse chutado de minha aconchegante ponte. Avaaanço num deserto sem fim.

É deserto ainda.

....

...... um oásis...

........

....

miragem


Avançando

...

nada

Em vão.


Mas eu não paro...

eu não paro...eu puxo cada fio da minha roupa, mas não paro. Avanço de novo, já sedento, já sem vento.

EU

NÃO

PARO.


NÃO TEM FIM...

eu não.

fim...



Um comentário:

Atreyu disse...

Tem uma coisa muito importante pra você no Destesto Estudar! =D
Prêmio Dardos!!!
Você é uma das Vitoriosas.
Entre e pegue seu Selo.
Bolhas de Canudo!