Me dei o direito de tomar groselha com leite
porque eu não estava afim de me embebedar
com algum destilado barato desses bares noturnos
mijados por bêbedos perdidos
fedendo urina amarelada
mas dei-me o direito, um dia, de tragar um cigarro
infame, que eu tanto me dei por ódio
que eu tanto recusei
e achei que eu fosse dona da casa noturna da esquina
mas minha fraqueza, mas minha hipótese de humano
que se entrega ao primeiro ônibus que passa
à primeira luz que me cega
ao metro lotado de São Paulo
quase chorando, quase absurdo, quase ardido
de tanta gente, tanto nada, tudo repleto de um vazio imenso
mas eu poderia ser tudo o que é nada
eu poderia ser esse vazio imenso dessa tragada
eu poderia me embebedar de um destilado barato
e mijar na calçada
e eu posso
porque não sou nenhuma princesa de bordados de lã e seda
sou essa qualquer uma
qualquer alma que respira o mesmo ar poluído que todo mundo
mas dou por uma noite
uma tragada do cigarro de alguém
e um trago de uma cerveja amarga
entre essa vida que corre rápido, desde o momento que nasci
até o momento que estarei em qualquer lugar que se ache depois
de ter vivido tudo
mas eu não viveria tudo nem ainda viajei
por essas matas densas
por esses desertos imundos quentes
por essa gente desafinada que canta
qualquer música da parada
qualquer linha que segure entre o meu vômito
e o segurança da loja de carros importados
da Rua Augusta
até essas alamedas com nomes de países da América Latina
de Tatuí à São Paulo
de Paris aos meus testículos inflados
( se eu tivesse testículos)
se eu tivesse uma horna se quer na vida
mas tudo isso, acredite
não é com nenhuma amargura
não é com Ânsia da vida
nem medo de solidão
muito menos qualquer coisa que cheire podridão aqui dentro
mas como qualquer coisa por ela mesma
sem manipulações ou demais correios
ou demais alucionações
mas minha última, primeira, incrível
vida de quem bebe leite com groselha.
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