segunda-feira, 29 de junho de 2009

É amor, sem paixão.

Eu precisava escrever, afinal, era o que me restava. Lembrar e escrever. Lembrar e escrever. Lembrar e lembrar...! Se a única coisa que eu faço é isso, vamos registrar lembranças. Meu esmalte vermelho estava descascando, e esse era o momento. Não terei outra oportunidade de escrever o que sinto justamente agora. Sabe, como essa mania de analisarmos e pensarmos depois que isso só nos fortaleceu e eu continuo viva. Bem, se eu não ler, isso realmente me derrotou. Mas a minha única esperança agora é que eu possa olhar para trás e pensar pra frente. As outras esperanças quero esquecer. Porque a gente também tem esperança de não ter mais esperança em certas coisas, e essa esperança eu realmente queria que morresse.
Aceito essa condição. Estou tentando ver o lado bom desse lado ruim. Sempre há. Eu digo: Sempre. Por mais que o teu coração esteja explodindo em milhares de pedaços e você ainda nem tenha encontrado o primeiro, mas, meu bem, acredite quando eu digo que existe o lado bom. Não morri. Ainda tenho meus olhos, duas mãos, sinto cheiros e continuo gostando de doces. Só não posso comer chocolate. Ainda escuto Chico e consigo não virar inteira lágrimas. Só não sei o que eu faço com esse monte de Amor aqui dentro. Vou doar e um pouco pego pra mim. Afinal, só eu sei o quanto cabe aqui e, querendo ou não, vou ter de me suportar pelo resto da minha vida. Não é um carma. É viver. E é tão maravilhoso viver que isso dói. Dói porque não estamos acostumados com isso. Dói porque o lados ruins prevalecem muitas vezes, não porque queremos, mas porque tem alguma coisinha cutucante lá dentro que fala: Isso dói e não sara. E aí vem sua voz que é tão forte como uma buzina de caminhão e grita o mais potente possível: Sai de mim, coisa ruim. Uma expressão como a do quadro O Grito - Edward Munch.
Eu sinto fome, e isso é um bom sinal.
A relatividade me doí às vezes, e dessa vez ela não me proporcionou.
Me olho no espelho e penso: Como sou linda, e eu morro de rir de tudo.
E pensei em rir da vida também. Ninguém vai fazer isso por mim. Estou tendo alguma chance que eu não consigo ver, ah não ser me empenhar mais nos estudos, me adaptar em São Pã, me amar mais, emagrecer, porque agora quero conhecer meus outros lados, e eu não me conheço magra. Hahahahaha. Quero ver até onde posso ir. Eu sei que posso ir até onde eu quiser, mas eu sei que esse querer e poder não é imediato. Estou fazendo meditações de como controlar minha vida e não ser tanto jogada ao acaso, ao Deus dará. Mas, querendo ou não, minha vida sempre foi assim, como um barquinho na correnteza, às vezes entra alguém, às vezes não, às vezes chove e é muito raro eu não chorar, mas choro porque estou viva e sinto, e isso me deixa mais humana. E isso não significa que eu chore apenas de tristeza. Mas choro porque sinto saudade, e se sinto saudade é porque o que passou foi muito bom, foi tudo muito mágico, e é isso que eu preciso fazer agora: mágica.
(Eu ri tanto, Deus. E isso me fez tão bem. Lembrei dos velhos tempos de escola, e de como em cada momento da minha vida meus amigos se fizeram presentes)
Porque tudo é da maneira que vemos.
Peguei na mão o último chiclets. E o amassei, e fiz bolinha, desenhei com a minha unha nele um jogo da velha. Um papel lamecado de choro e restos gosmentos nasais. É meu, apesar de ser nojento.
É, essa vida é realmente muito irônica. Eu percebi... me tirou um amor e me deu a minha camera de volta, linda, funcionando como antes, fotografando-me e fotografando outras pessoas. Aliás, se eu não posso ter uma, terei todas. Que meu prazer seja clicando enlouquecidamente. Que meu prazer seja lúcido. Nada de drogas, bebidas, maconha.. eu sei que não vou me encontrar nisso, nunca me encontrei. Tenho uma queda louca pela arte. E é isso que sempre me resgata quando estou no fundo do poço. Tons, cores, sons, instrumentos, livros. Incansavelmente, são sempre eles que me amparam e de repente me encontro novamente como nos velhos tempos, só que um pouco mais velha, mais madura, o cabelo mais armado, e com a mesma sede por viver, com a mesma felicidade louca e doentia. O que acaba acontecendo é : vou pensar mais em mim. Mas vou confessar uma coisa, eu já pensei tanto em mim, que se eu continuar assim, no final da vida acabo casando comigo. Eu quero olhos alheios. Quero cheiros diferentes. E sim, eu quero um tempo pra mim. Afinal, eu realmente preciso disso. Mas ó, nada de sacanear mais. Já aceitei uma vez, e vou aceitar sempre as condições que você, senhora Vida, me impõe. Como dizem: nada é por acaso. E vai ser delicioso sentir as coisas não como eu quero, mas como me impõem. Sem esquecer que estou meditando para me controlar, mas o barquinho ao Deus dará é inevitável.

Ela é realmente muito linda. Não poderia ficar feia depois que nos separamos. Ela é linda em tudo. Até para terminar comigo ela foi incrivelmente bela e racional. Livre e sadia. Ah, liberdade! Mesmo no fundo eu a querendo ver feia e ter muito ódio, mas isso foi um remédio imediato e não funciona nunca. Linda. Os cabelos bem longos. É sério, estavam incrivelmente longos e lindos. Parecia que não a via há anos. Pulei no pescoço dela e implorei para que voltasse. Diga que fui eu quem errou. Diga que a chama ainda está muito quente em você. Não deixe que isso se apague. E eu chorava feito um bezerro desmamado. Diga que ainda me ama. Diga que isso é tudo besteira, e você teve um ataque momentâneo de dupla personalidade... aquela outra que te invadiu da primeira vez. E que você ainda, ou pelo menos parte de você me quer, me deseja e fica cega de amores. Uma bola saía de minha boca. Quase uma bola de pêlos, e continha tudo o que desejava. Levantei minha cabeça e ela continuava falando, como da primeira vez, me olhava nos olhos às vezes, e eles pegavam fogo, me atravessavam, me comiam, e aceitei que seria assim. Nenhuma marca no pescoço. Nenhuma foto minha no quarto. E o quarto estava arrumado. Como se nunca antes eu tivesse entrado. Mas eu entrei, dormi com ela, a beijei, a amei muito, enlouquecidamente, no calor, no frio, com cobertor, de meias, de roupa, com água, e todo meu interior borbulhando. Mas aquele não era mais o quarto que abrigava nosso ninho. Não era mais o quarto que a fez chorar da primeira vez que eu fui embora... eu bebi sua lágrima. Ele parecia mais claro - ainda havia minha escritura na parede - ele ilustrava o que estava no coração dela, limpo e branco. E o meu ainda era vermelho vermelho vermelho vermelho... e empoeirado. Aceita-se faxineiras. Ela me parecia muito bem, muito bem mesmo, e isso me fez não chorar durante um bom tempo enquanto eu falava e ela também. Chorei no final, de charme também, enquanto a beijava pela última vez - gosto de chicletes e despedida - enquanto eu a abraçava bem forte, e ela me abraçava me confortando, mais como uma desconhecida que encontrei na rua, totalmente alheia, mas compreensível, do que a menina que me fez gostar dela duas vezes. Eu estava bem afinal, só precisava esclarecer algumas coisas e sentir de novo essa dorzinha. Mas sentir pela última vez.
Nenhum pranto os teus olhos me destes
nem te comove a dor da despedida
Pergunto- me agora: Que diabos é essa paixão? Se teve algo que me intrigou e me fez aprender mais uma coisa nessa nossa humilde vida foi que, para se ter alguém completo necessitamos de - como numa fórmula básica de matemática: Amor + Paixão. Pensava eu que vivíamos apenas de Amor, o resto era consequência. Mentiram pra mim. Mentiram legal, hein. Hahahaha, enganei-me. Enganei-me. Paciência. Bem, seguindo outra lógica, e isso é uma maneira de tentarmos entender nossos fracassos: dizia ela que, estava sendo metade nessa nossa união decadente. Ela = metade. Amor+ Paixão = Inteiro. Só amor, seria metade. Ela sem Paixão. Portanto essa metade que ainda sobrava era Amor. E era essa metade que eu achei que faltava. Mas é paixão, é o foguinho, o combustível, e isso o Amor não foi capaz de dar. Rebaixado.
- Gosto muito de você, leãozinho!
Estou bem, o coração continua, o temo urge, a vida passa. Você tem um lugar especial no meu coração arrítmico. E quero envelhecer contando que eu tive uma menina linda, que posava pras minhas fotos, meio sem jeito e paciência, e que odiava que a mordesse ou beliscasse, mas tinha um sorriso lindo e uma coragem que eu nunca antes vi na vida. Uma menina que adorava molas e caixinhas de música, e me fez gostar dela duas vezes, preciso enfatizar isso. Se não dá certo na primeira, força, que na segunda sempre vai. Ai eu já não posso dizer mais nada. Não sei o que virá depois. Podem até ser palavras ao vento, coisas bobas, mas é o que estou sentindo agora. E isso conta, não? Amamo-nos todo dia e não foi pra sempre. Minha menina! Você merece tudo de bom. Merecemos. Eu tenho um pouco do seu mel e do seu amargo. Te amo e vou deixar essa paixão ir embora, algum dia, pra sempre ou não, sem pontos finais como você disse, vírgulas talvez, ponto e vírgula, nova frase, novo texto, outro livro. Eu te amo e te quero bem. Não vou ter medos das chuvas, nem dos dias frios e cinzentos, gosto deles, afinal, só vai ser mais friozinho sem o seu calor de sempre, mas eu pego um cobertor bem quentinho e respiro bem fundo pensando que amanhã o dia pode estar ensolarado, que dentro de mim tem um sol pegando fogo.
E você é livre, vá! Fica bem, amor. Pela última vez deixa eu te chamar de Amor. Me manda um beijo por telefone pra eu ouvir o barulho do estalo. E as pipas sem vento? O que serão agora? Estou louca para ver. Encontra-te agora, que eu farei o mesmo.
E foi isso.
Aonde está você agora além de aqui dentro de mim?



Vai ser dificil sem você

porque você está comigo o tempo todo

e quando vejo o mar

existe algo que diz

que a vida continua

e se entregar é uma bobagem
já que você

não está aqui,

o que posso fazer

é cuidar de mim

quero ser feliz ao menos

lembra que o plano era ficarmos bem?


... e o vento vai levando tudo embora.
"Toda a minha saudade, e o meu amor de sempre."
"Seja como for, continuo gostando muito de você - da mesma forma -, você está quase sempre perto de mim, quase sempre presente em memórias, lembranças, estórias que conto às vezes, saudade..."

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Um furo, um frio

Acabei de perceber um rasgo embaixo do meu braço. Enfiei meu dedo e minha coluna arrepiou por causa do friozinho que entrou por ali. A gente percebesse que o coração também está assim, porque todo dia me dá esse friozinho por dentro, e é sempre minha mãe que costura. Acho que ninguém foi tão corajoso de tapá-lo. Alguém que não fosse minha mãe. Digo, alguém que ainda não tem filhos e ... nem eu sei. Agradeço sempre por ser quem eu sou. Afinal, minhas unhas estão vermelhas, e é a primeira vez que as vejo assim. Não virei puta, nem sem vergonha, embora quisesse... ser sem vergonha. Puta eu já sou desde que nasci. Todo mundo vem, deposita um pouco sentimento, deixa apurar, vai embora e eu continuo com o rasgo na roupa. Alguém me diga, há linha pra isso?
Borrei a maquiagem, de propósito. Vi-me completa. Uma puta com nome. Depositem tudo. Estou aberta, um furo ali, um frio aqui, nada que uma cachaça, uma noite mais ou menos bem dormida, uma agua gelada no corpo não resolvam. Afinal, eu não to falando de sexo. E se estivesse? Tenho quase vinte anos. Dei pra todo mundo, mas foram poucos os que receberam. Foram poucos os que eu realmente me dei. E aí, meu bem? E daí? Aprendi que o negócio sempre foi cuidar da sua vida.

- Pense mais em você

E eu cansei desse papo furado. Eu sei que eu sou nova, eu sei que tenho tudo pela frente e vomito se alguém me disser que tudo o que se passou não foi em vão. Não foi em vão porque a bunda deles não estavam na reta. E foi uma reta bem curta, eu digo, tão curta que pareceu longa demais, intensa demais. Todo mundo incansavelmente já sabe cada história de rasgo na roupa. Pergunto: cadê a consciência?

- Povo burro

E eu digo que o cu só não é mais burro porque o coração faz o trabalho. É ridículo demais, é pouca coisa pra um mundo construído. É absurdo esse negócio de " eu não quero rasgar mais sua roupa do que já está rasgada". Filmes poluem nossa mente. Mas no final é o que nos resta: chorar e chorar e chorar, tomar chuva dançando ao som do Gene Kelly e chorar e chorar. Com estilo. Afinal: merecemos sofrer decentemente. Já não basta essa roupa de mendigo.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Poeira

- São Paulo é meio solitária
- Na minha rua não.

... e ela me disse isso, sem entender o que eu queria dizer. Tanta gente e ao mesmo tempo ninguém. Parece-me um amontoado de almas que vagam pra lá e pra cá, e se encostam em você, é como se passassem pelo seu corpo, sem sentir, sem te ver. Mas eu as vejo, vejo sim, e quanto mais as vejo mais me sinto alheia.

Não resisti. Lutei contra mim mesma para não expressar nenhum sentimento e esquecer o que quer que tenha acontecido. Mas não aguentei. Amanheceu chovendo e dias assim parecem que cravam uma faca no meu coraçãozinho ardente e ficam cutucando para ver se sai sangue ou água. Dias chuvosos são tristes sem você... e é inverno. Passei os últimos dias do outono sozinha, mas já parecia ser uma estação indefinida, misturado ao meu último dia. Chover era a última coisa que eu queria.
Meus olhos doíam tanto que eu mal conseguia fechá-los. Parecia que eu tinha tomado uma cachoeira de água que vasavam por cada poro do meu corpo. Paulista inteira sentiu o gosto do meu soro. Não havia maneira, lugar, ideia, pessoa ou céu azul que me fizesse crer em um dia feliz.
Andei tanto... nem meus pés cansavam mais que minha dor. Minha cabeça parecia que ia explodir, aí eu me acalmava por breves segundos, e depois uma bigorna caía sobre mim. Já não acho mais nada de nada. Tudo corre absurdo e muito, muito muito surreal. Queria sair do meu corpo, viajar bem longe, para um lugar que não houvesse pisado seus pés, nem tivesse cheiro. Mas todo lugar que eu vou tem um pedaço seu. Como aquele poema de Drummond, Resíduo -" de tudo fica um pouco, do meu medo, do teu asco, dos gritos gagos..."

"...se tudo fica um pouco, mas porque não ficaria um pouco de mim?"

Eu poderia ir à França, e lá teria um pedaço de você. E tudo nessas duas cidades que vivemos parecem te ter inteira, sem nenhum pedaço faltando. Cada paralelepípedo dessas ruas antigas tem uma lembrança de seus pés... meus lugares preferidos, a praça, o sorvete, meus amigos, meu quarto, gasolina, frango, cartas, metro, universidade, augusta, paulista, masp, frio, chuva, músicas e até meu muquifo empoeirado, e mais zilhões de coisas que não me deixam escapar, nem meus sonhos. Absurdamente uma prisão.
Dói tanto. A saudade é tanta.

" disseste que se tua voz
tivesse força igual
à imensa dor que sentes,
teu grito acordaria
não só a tua casa
mas a vizinhança inteira"
E isso me resumiu, logo que ouvi essa música. Como uma dor imensa, um sentimento indefinido.
Já disse tantas vezes que acho que nunca superei perder as pessoas, e essa pequenez, essa ironia do destino me deixa me sentindo como uma ameba esmagada. O que somos, afinal? Não podemos controlar nem nossa vida. Somos pequenos. Somos algo jogado no vento, nem podemos nos medir. Somos livres... até que ponto? Até que ponto, meu Deus, não somos nós mesmos? não somos nós que decidimos se vamos beber água ou rabiscar um sol.
Pensei tanta coisa, sabe. Relembrei outras. Era tudo tão branco. Tudo parecia dar certo, caminhando como nunca antes minha vida havia ido. Como nunca antes minha vida havia dado certo com alguém. E meu coração escorreu pelo ralo.
Lembra daquele poema de Antonio Gonzaga? A Lira 77 de Marília de Dirceu, que ele já está delirando, sem poder nunca mais tê-la? Sinto-me assim, exilada, numa prisão fria e cinza e... chovendo. E você me disse uma vez que gostava tanto de chuva e eu te disse também que gostava bastante. E aí você colocava a cabeça no meu colo, dava-me beijinhos, eu suspirava e pensava que queria que o tempo parasse, que toda aquela coberta em cima de nós nos conservasse inteiras por muuuuuito tempo, mas aí a chuva parou, o tempo correu... já não gosto de dias assim. O que me resta, sempre, são só palavras. Nem migalhas, nem abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim. Nem amores do tamanho do universo. O que me resta é sempre esse amargo meio doce da vida, essas palavras mudas, esse sonho ardente e meus olhos jogados. Indiscutivelmente são pedaços de mim, feito metade de amor e metade poeira.
Andei por aquele shopping que fomos uma vez. Entrei, os pés arrastando, como na noite do homicídio, desci a escada rolante. Fiz o mesmo percurso que fizemos da primeira vez. Você tinha me apontado um quadro na primeira barraquinha que se avistava. O quadro já não era o mesmo,era outro, não lembro o que, mas era. Passei por ele e na barraquinha ao lado havia um senhor, meio rabugento, que vendia notas e moedas antigas e de outros países. Na primeira vez fiquei um bocado de tempo olhando os catálogos, como se soubesse que da próxima vez não chegaria perto deles, porque precisava correr atrás da sua sombra que dissipava a cada passo que eu dava. Muitas barraquinhas... as outras me passaram como um borrão, eu precisava ir mais rápido para aquelas últimas, no canto. E vi, ali, intactos ainda, os quadros, absurdamente iguais de uma mesma bailarina,o que mudava eram as cores e combinações. Thaís. Você ficou tanto tempo olhando aquilo, parecia que queria ser a bailarina do quadro. O rapaz, que era esposo da pintora, nos apresentou muitos produtos, como se fossemos comprar a loja inteira, mas estávamos ali por nada, dissipando o tempo, combatendo o frio, eu alheia a você e vice-versa. Fui para outra barraquinha que vendia livros, enquanto você ainda conversava com o cara. Perguntei ao senhor que vendia os livros se ele já havia lido O Capital- Marx, e ele me disse que sim, todos os volumes. E começamos um papo bem longo, tanto quanto o seu com o rapaz da mulher que pintava a mesma bailarina. Muito tempo, e aquele senhor me falava muitas coisas, até me deu um filme de presente, que segundo ele, distribuía para as pessoas, como uma forma de " dominar o mundo". Você juntou-se a mim, mas não se interessou pelo assunto e saiu logo, foi ver outras coisas. Não era o mesmo senhor que estava na barraca. Havia dois agora. O rapaz das bailarinas era o mesmo. Nunca me viu na vida. Pedi para fotografar os quadros...uma foto, Disse a ele que era pessoal, particular. Coitado, achou que ia roubar alguma coisa, direitos autorais. Não, meu bem, eu só queria resgatar alguma coisa que ainda havia dela. Mal sabe que a namorada dele um dia, longe ou perto talvez, vai quebrar cada quadro no coraçãozinho dele. Amargo e belo. Tudo bem, me despedi e fiz o trajecto. Tudo muito frio como da primeira vez. Muitas pessoas, alguns adesivos de parede da Audrey, que eu particularmente colocaria bem na porta do meu quarto. Como me doía cada canto dali. Como ela me doía num céu tão lindo daquele. Eu não era eu. O perfume de cupuaçu me entrava, muito rápido pelo nariz e sumia, na mesma velocidade. Vi muitas de você pela rua. Rezava para te ver, de longe, naquela multidão, um fio de cabelo que fosse. Mas era outras, completamente diferentes. Eu até apressava o passo para conferir. Não eram mesmo. Porque essa sede de resgatar lembranças? Eu inteira sou lembranças. Saudade. O que vem depois é um espelho de agora. Lembranças. Fugi. Fugiria de mim, se pudesse. Não aguentava mais me torturar. Mas era tão difícil, querendo ou não, doendo ou não, era o único remédio. Parece mertiolate.
Quase uma semana. Recuperei-me consideravelmente. Quando já passamos por essas coisas, parece que nosso corpo cria anti corpos. A saudade é muita. Aceito essa proposta. É sempre um desafio. Ela é livre. E ser livre é uma beleza nossa. O tempo. Nos traz, e também nos leva. O coração continua.
E ainda metade é amor... e a outra é poeira.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Só quando Deus quiser

Perguntou-me assim, num tom de meio entusiasmo disfarçado:
- O Senhor vai mesmo viajar pra lá?

Respondi que sim. Viajaria para lá. No sábado talvez... queria passar o domingo longe.

- Mas, e os cachorros?

Os cachorros ficariam, claro. Precisava ir só com minha companhia. E lá não aceitam animais assim, de monte.
Fui.

- O senhor volta quando?
- Só quando Deus quiser.

terça-feira, 16 de junho de 2009

A-T-O-A


Vou escrever que o cachorro saiu correndo, fuçou um saco de lixo e achou um osso. Um osso grande, no formato desses que passa nos desenhos. Depois ele saiu feliz, com o osso na boca e foi dormir debaixo de um banco de alguma praça central de alguma cidade pequena. E é isso. Não é metáfora, nem alegoria, nem nada.
Minha bexiga está cheia e eu estou me retorcendo para segurar meu xixi...
[2 minutos depois]... pronto.
Olhei-me no espelho e vi-me um bagaço. Cabelo sujo, pele oleosa, camiseta manchada. Tão eu mesma, talvez. O dia está frio, mas eu pareço derreter. Vi-me uns 30 anos mais velha, fritando coxa de frango e engolindo pinga barata para suportar o peso.
Mas ainda bem que foi tudo um delírio de momento, um impulso num dia frio, depois de assistir filme debaixo de um cobertor comendo pipoca.... doce. Um delírio apenas.
Minha cabeça está vazia. Sem entupimentos. Aliás, até devo ter muito o que escrever, mas está vazio. Oco...
Já se sentiu oca, alguma vez? Posso até me batucar.
Duas semanas aqui, se eu tivesse barba, ela já estaria enorme.
Duas semanas aqui, se eu tivesse coragem, estaria lá. Lá em algum lugar que não seja aqui, nem São Paulo, nem meu quarto, nem...
Duas semanas aqui e eu apenas envelheci. Aprendi algumas pequenas coisas da vida, levei alguns puxões de orelha, e até chorei. Sorri também, lembrei de alguns factos e percebi mesmo que envelheci. Eu tinha 17 anos ontem. E meus 14? 10? Que saudade.
Vi-me brincando na rua. Eu cresci. Muitas pessoas cresceram junto comigo, algumas ficaram, outras foram até a metade.... que metade, hein? Qual é o inteiro? Alguém por favor, me dê algo bem alcoólico.
Eu achei que ia falar só do cachorro comendo osso.
Se eu fosse um animal, eu seria... um panda. Lindo, em preto e branco e só dorme. Se eu fosse uma fruta, seria melancia. Verde por fora, cor de rosa avermelhado por dentro, com pintinhas pretas, tem um sabor delicioso, muita água e um cheiro muito bom.
Se eu fosse um objecto de madeira, eu seria... um baú... com cadeado.
Acho que eu precisava mesmo disso.
Se eu eu fosse uma parte do corpo, eu seria... alguma artéria, pulsa muito, muito muito, e não tem medo de sangrar. [risos]
Se eu fosse uma cor seria vermelho. Se eu fosse duas, seria preto e branco. Se eu fosse três, seria vermelho, branco e preto.
Se eu fosse uma estação seria outono
Se eu fosse um trem, seria o bala. Se eu fosse um doce, seria chocolate, meio branco, meio preto (meio amargo). E se eu fosse alguém, seria eu mesma. Com dores e sorrisos, seria eu mesma.
Se eu fosse dinheiro, seria uma nota de dois reias, por causa da tartaruga.
Se eu fosse a tartaruga, odiaria estar na nota de dois reais.
Tá bom, cansei. Num outro dia talvez, eu mude de ideia e pense ser outras coisas. Como se eu fosse uma cor seria... bege. É, mais ou menos isso.Hoje eu seria tudo isso aí, amanhã, quem sabe, eu serei 1 centavo, jogado no chão, pisado por cãezinhos levando um osso. Muito digno.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Mon outono, amour.

Era outono. E só de ser outono já se alegrava muito.
Era outro. E só de ser outro, o alegrava um pouco.
gostava de viver na própria pele
às vezes enjoava mas, quem não enjoa, pelo menos por alguns segundos,
de ser você mesmo... mas gostava.
Era doce. Era amargo.
Chocolate preto e branco: o branco
Com amendoin ou avelã: Avelã
Era alto. E por ser alto, sentia-se mais perto do céu. Podia voar.
Andando, mas podia voar. Correr também gostava.
Era outono e chovia muito.
Era outono e fazia muito frio.
"Fazia muito frio em São Paulo"
Era Paris ... e com as pernas subia e descia a torre.
Também era muito frio, mas ainda era outono. No inverno, quem sabe, nevasse.
Mon amour!
Dá-me tua mão
teu suor
teu outono
dá-me a água
...
E era água. E só de ser água alegrava-se por
poder ter o formato que quisesse...
era água e podia dividir-se em mil gotas
em mil partículas e cair lentamente
deixando reluzir o brilho do sol na pele aguada e macia.
Quis ser Vento
mas resolveu deixar como estava
pois ele adorava ouvir o vento passar e sendo o próprio vento
não o ouvira tão lindamente.
Era outono e chovia.
Mon amour.
Paris ainda é a mesma do que via
em quadros antigos
Modigliani, Utrillo
árvores, cabarés
Moulin Rouge e o anão
Era pintor. E só de ser pintor o deixava colorido.
Pintava-se como nunca antes havia pintado
os quadros tinham sua silhueta
a silhueta grudava em outras silhuetas
mais finas, outras robustas
roliças
pequenas, altas
E era frio em Paris. Não em São Paulo.
E pintava e pintava e jogarra tinta
como sangue jorra da artéria
e vermelho
e silhueta...
Era outono.
Era ele mesmo
e mais outros e mais outros
e nevava.
Era inverno.
Por fim, passou-se os pássaros pousaram na árvore adormecida
as tintas jogadas bailavam pelo salão e a cada tropeço,
era uma gota que ficava
de suor, de sangue
de água
de cobertor na neve.
Era primavera
porque só de ser primavera, florescia.
E cada flor que brotava era um beija flor que vinha
cada beija flor era um pretendente de amor
Era Amor, e só de ser Amor, ele não queria mais nada.
Andava descalço, bailava, era tudo.
Era verão, e o calor radiava em sua pele. E só de ser calor
sentia-se Calor e Amor
porque ele não poderia deixar de ser Amor
Não era Paris.
Mentira... era a própria Paris.
A Torre...o pico. E lá de cima, por ser mais alto e ainda ser alto
gritava:
Je 'taime, mon amour.
Amour?
Mon?
Quem?
E era dúvida. E da dúvida veio a certeza.
Ele próprio era mon e amour.
E repartia, e ambas as partes passeavam pelas ruas
era ele mesmo
era alma gemea.
Era outono
Era Amor
Um ciclo.
E só de ser um ciclo, sentia que mudava
e voltava às raízes.
E só de mudar, percebia que era outros. Outros nele.
Era outono e tinha um vento gelado
e tinha sol
e tinha água
e era apenas outono
e era apenas Amor.
Mon Amour.

sábado, 6 de junho de 2009

Era a princesa que... me pesou a ausência

Para ouvir ao som de Chico Buarque (ou Beethoven)
"Se na bagunça do teu coração, meu sangue errou de veia e se perdeu"
Chico Buarque
" Quero ficar no teu corpo feito tatuagem, que é pra te dar coragem
pra seguir viagem quando a noite vem "
Chico Buarque
Te vi ontem. Sonolenta, o rosto com restos de maquiagem, um cheiro de cigarro pelo ar, travesseiro e cabelo. No seu colchão-quarto deitada com o cachorrinho de pelúcia esmagado entre os braços, mal abria os olhos para me ver. Meu coração todo pulando pela boca pra entrar em você e fundir-se , dolorido de facto, mas acima de tudo, vermelho de amor.
Te vi ontem. Há um dia. Um dia apenas. Pouco, pouquíssimo. Mas eu estou que não me aguento de saudade, de " brincar no teu corpo feito bailarina". Não tem como não citar Chico. Ouço, nesse exato momento João e Maria - agora eu era o herói e o meu cavalo só falava inglês, a noiva do cowboy era você além das outras três" - como se você mesma fosse as outras três, não sei, cada uma diferente da outra, sabe? outras mulheres em uma. Foi só para contextualizar esse trecho no nosso facto romântico. Quem sabe você tenha mesmo algumas aí dentro de você: uma que adore sorvete de flocos e outra que toma sorvete de goiaba com beijinho, uma toda selva fera ferida, e outra que reze muito. Quem sabe uma que raspe o cabelo e vire monja. Mas a única é essa mesmo que me agrada e que eu tenho nos braços e me faz chorar de saudade - "e você era a princesa que eu fiz coroar e era tão linda de se admirar" - princesa, minha princesa. Viu, tem até uma princesa em você, e isso é pura verdade, porque eu posso ver sua coroa de ouro ( ou de louros? ) brilhando ( não mais do que o seu sorriso que me deixa no chãããão). Detalhe, eu fiz coroar. - "eu era o seu pião, o seu bicho preferido"- um bicho, peçonhento que seja, mas um bicho cheio de amores. Gacto malhado? Sem rua, sem teto... Mas seu.E me vejo dormindo no braço de um sofá de alguma casa abandonada enquanto as frestas da persiana me listram com uma luz de fim de tarde, quase laranja, quase fraca, quase eu envelhecendo, mas completamente linda, completamente única- vem me dê a mão, a gente agora já não tinha medo, no tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido" - e de repente, no outro canto do sofá surge você, listrada também, dormindo um sono muito profundo, enquanto eu, mudando de listras a todo momento, te observo, quase como se fosse pegar um novelo de linha ( mas que novelo de linha mais lindo) .
Te vi ontem. Te vi sim, mas você parecia não estar me vendo como eu te via. Sua cabeça parecia estar em outro mundo, um mundo novo, mais urbano e paulistano do que antes, augustiniano de facto. Um jeito de falar diferente, e a maquiagem ainda resistia no rosto, no olho, em principal. E eu te olhava. Sua cabeça no assunto do momento. Eu apenas te olhava e ainda sentia saudade. Essa saudade que incrusta em você, como ferrugem num cano velho e é difícil de sair, essa ferrugem mesma que grudou em mim. Uma ferrugem boa, mas se deixar ela toma conta, te move e você pesa muito, como se a cada passo que você fosse dar, abrisse um buraco no chão. Não tocava nenhuma música, nem veio nenhuma na minha cabeça. Uns carros e buzinas, quem sabe, láááá embaixo. Eu te olhaaava muuuito e me esforçava para não fazer isso, mas você me chamava, ou melhor, um outro lado seu me chamava, um lado que me olhava também, o outro dava alguns gritos e meu ouvido dizia: está bem, eu fico longe... e misturava-se no assunto. O lado que me olhava, pode ser delírio de minha parte, pedia alguma resistência. Deixei. Enquanto sua boca me dava beijinhos secos ( é o frio) seus olhos olhavam alguma coisa. E ficou meio um beijo torto, metade pra lá, metade pra cá. Mas eu não posso deixar de falar que você estava linda... a mais linda de todas. Devo até ter te falado isso, mas não saiu meio convincente e no fundo eu mesma falava pra mim: "Ela é linda mesmo, veja o sono, e os olhos pretos, que delícia esse cabelo no meu rosto. Chegue mais perto, me beije. Linda" e eu dava sorrisinhos.
" A saudade é o pior castigo", já dizia Chico. O que foi, hein? É isso que você quer? Castigar-me? Pois bem, castigou-me... muito aliás. Ajoelho e imploro, volte logo. Me perdi, em um dia eu me perdi. Ou me encontrei em outro lugar, longe, bem longe. Eu me quero de volta, e se essa apelação não resolve, digo que volte, se tiver alguma compaixão no seu peito, nem que seja para eu ficar olhando sua parte que me olha e esquecer a parte que me esquece. Volta para almoçarmos juntas.
Apelei muito. Apelei mesmo, porque aqui, pelo menos, no meu muquifo empoeirado, eu tenho o direito de apelar, de rogar, implorar sua volta rápida. É horrível ficar sem você. Até voltei a usar minha calça rasgada e meu cabelo já armou muito. Imploro aqui, porque isso me alivia. Você sabe ( ou se não sabe, comunico-lhe agora) que eu entendo que esses dias foram o começo de uma página virada, de uma nova vida, que aliás eu sempre apoiei. Que cada um tem um tempo de adaptação ( o meu ainda está activo) e que não é fácil. Mas eu necessito de você. É um absurdo, eu sei, mas isso me afecta também. Que seja...
Abstenho-me, porque ainda sinto você comigo, e isso deve ser uma maneira de suportar minha solidão. E isso deve ser o amor, né? porque não é possível essa distância enorme que me trás seu cheiro enquanto você caminha num outro lado da calçada.
E isso é saudade. No fundo eu tenho medo, não sei do quê exatamente. Se tem alguma coisa que resume qualquer coisa isso, é medo( e egoísmo, como eu diria há algum tempo atrás). Medo da saudade talvez. Medo de você longe de mim. Não nego, não vou negar. Essa é minha parte fraca, minha ferida que tento esconder, minha face machucada. No fundo a gente só fala besteira, e desconta tudo nos sentimentos, que são mais puros do que delírios. Que é quando a gente não sabe o que fala, mas precisa falar porque deve ser mesmo essa psicologia de escrever que alivie. Algo como auto medicação. Como tentar sanar minha doença. Algo como " vamos escrevendo, é isso que eu sinto agora".
Mas bem, não posso negar a saudade. Não posso negar que sinto falta do seu calor, dos seus cílios, da sua pele morena. Se um dia você ler isso e não digerir nada, talvez nem seja para digerir mesmo, que fique o único ponto que explicíto todo o tempo: S A U D A D E. Se você entender isso, está bem. Saudade da Lua. Daquela lua que vimos numa noite, quando voltávamos de algumas fotos. Saudade de Cheetos, do colchão de ar, de te abraçar bem forte, de você falando do meu cheiro de gasolina, do seu sorriso torto de boca machucada.
Eu quero você.
E se eu falei tudo isso, num delírio, num ataque repentino de escrita, é porque eu te amo, e eu queria te dizer isso, num tom que ensurdecesse a cidade toda, quiçá São Paulo inteira. Num tom jamais dito. Num tom exato de Eu Te Amo, nunca visto em filmes nem novelas. Acompanhado quem sabe de um... saxofone? Estranho. Mas eu sei que você gosta.
Volta logo, tá? Tem alguém te esperando. Tem alguém torcendo por você. Tem alguém que te ama e te acha linda (e não é sua mãe). E essa pessoa está delirando de saudade. Ela delira mesmo... isso é uma ameaça. Volta logo, que tem alguém pra te fazer um almoço muito especial, comemorar datas especiais, te encher de beijinhos e carinhos sem ter fim e acima de tudo, te amar com esse gosto de distância, que quando chega, é um alívio, é um cheiro doce no ar, são os pássaros cantando... sou eu esperando sua volta.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Breve saudade

De palavras.... faço-me... Rapidamente, como estas, construo-me em bases saudosas.
Eu não queria falar sobre saudade. Minto, não queria falar agora. Agora preciso escrever rápido.
Quero escrever teses e teses sobre o que é saudade. E isso, senhores, me pesa demais, como um piano amarrado no meu pescoço e jogado do 11° andar de algum prédio da Augusta.
Breve, muito breve. Mais breve que o ar do meu pulmão, mas a saudade é longa, mais longa do que minha vida passando.





quarta-feira, 3 de junho de 2009

Daquia pouco...eu melhoro!

Fica frio à noite.

A cabeça borbuuuulha.
Preciso tomar meu remédio, mas não agora.