sábado, 27 de dezembro de 2008

200 Postagens e mais nada me muda


"É bom que seja assim, Dionisio, que não venhas.
Voz e vento apenas
Das coisas do lá fora

E sozinha supor
Que se estivesses dentro

Essa voz importante e esse vento
Das ramagens de fora

Eu jamais ouviria. Atento
Meu ouvido escutaria
O sumo do teu canto. Que não venhas, Dionísio."

Hilda Hilst

"Mas de tudo isso, me ficaram coisas tão boas... Uma lembrança boa de você, uma vontade de cuidar melhor de mim, de ser melhor para mim e para os outros. De não morrer, de não sufocar, de continuar sentindo encantamento por alguma outra pessoa que o futuro trará, porque sempre traz, e então não repetir nenhum comportamento. Ser novo."

Veio-me assim, de súbito esse trecho de Caio Fernando Abreu e senti-me angustiada, inútil e cheia, absurdamente cheia de saudade e incapacitacão.
Porque no fundo, sempre fica um grãozinho de areia do nosso passado que a gente tenta esquecer, mas que parece uma assombração que vai aumentando até sair pela sua boca na forma de uma bola de incertezas gordurosas. Você sabe, todo mundo sabe que o que mais nos assombra somos nós mesmos e nossa capacidade de memória emotiva rasgada e suja, e o cabelo oleoso que escorre idéias absurdas de metafísica e existencialismo.

"Eu sentia profunda falta de alguma coisa que não sabia o que era. Sabia só que doía, doía. Sem remédio."

Lavando com água e sabão a minha boca de palavras que não são minhas, eu caio feito bebê começando a engatinhar, mas eu não choro, eu não choro por covardia, porque o choro tá entalado faz horas aqui no goela, e sai raivosamente pelo dente, porque os olhos estão congestionados dos pensamentos formulados antecipadamente.
Tem dias que tudo está na beira do abismo, que a mão fica formigando, o pé lento, a cabeça pesada. Se eu pudesse fazer alguma coisa agora seria, sem dúvida, voltar no passado só pra sentir de novo aquele gosto de sorriso deslumbrado. Aquele sorriso falso e o cheiro inesquecível de sabonete hidratante. Torturo-me com isso em dias que vão e que vem. Agora não é sempre nem todo dia, mas são recaídas de saudade que eu tenho não tanto de você, mas de mim. Eu me encontrava em você, eu sabia quem eu era, e eu tinha cada minuto contado entre o estar em mim e sairmos de nós mesmos. Mas a vida corre, a vida corre... é preciso continuar mesmo estando plantada e concretizada num passado azedo com cheiro de enxofre. É momento, entenda, depois eu estarei pensando em outra coisa, limpando os óculos e fotografando em preto e branco alguém sorrindo que eu nem faço idéia de quem seja, mas é preciso continuar e ver outros sorrisinhos engraçados e outros cheiros de sabonete.
Porque nem tudo é como queremos...mas a lembrança é boa. Sempre foi boa, não nego. não minta também que você não queria, mas o problema é que eu vivo o momento. Entende? parei naquele momento e só. E você parece camuflar e se restabelecer em qualquer situação. Ahhh..! Eu nem sei porque estou escrevendo sobre você. Já faz tanto tempo.Talvez quando minha velhice chegar, aliás, velhice não, mas alguns anos a mais, umas lamebranças a menos, eu ainda continue escrevendo baboseiras. Ou não...posso sair dessa vida que só a gente sabe o quanto sofre, mas o quanto é gostoso sofrer pra ver o que vai sair literariamente!
...E muda em mim apenas o tempo, a roupa, uns cabelos crescem. Você, meu bem (des)amado de tempos remotos, vai ser sempre uma personagem minha. Tudo não passou de delírio e alucinação! Tudo não passa de momentos alcoólicos de um cheiro inexplicável.

Um comentário:

Atreyu disse...

"Eu sentia profunda falta de alguma coisa que não sabia o que era. Sabia só que doía, doía. Sem remédio."

LINDO
=D