sexta-feira, 11 de junho de 2010

Graça Fumaça Vitrola

No começo achei que nunca ouviria nada assim.
Assim, dessas coisas que a gente fala sem querer, que sai do coração mesmo, ou da pele, ou da boca linguaruda. Que sai sem pensar. Apenas sai. E saiu.
Depois do dia maravilhoso. A tarde toda debaixo da coberta esquentado meu gélido corpo. Cheguei à noite, a casa sozinha. Toda minha.
Um maço inteiro de cigarros em cima da mesa. Quanta asneira. Mas eu estava feliz demais para pensar no câncer. Tirei meus sapatos, joguei-os pro alto. Tirei a blusa. Abri a janela do quarto vazio. Tudo meu. O mundo é meu. Olhei pra vitrola, procurei um vinil na caixinha e coloquei um jazz no Glen Miller. Di-vi-no. Peguei um cigarro, acendi na terceira (nunca aprendi a acender cigarro), cambaleei dançante até a janela do quarto vazio. Frio. Luzes pra lá, alguns prédios, o bairro calmo. Fumei como uma poser, uma cena clichê de filme. Ando muito clichê, afinal. E não querer ser clichê por ser clichê também é muito clichê. Pensei. Fumei. Soltava a fumaça como uma actriz, faltou a piteira. O jazz tocando, a noite só minha, o frio só meu, pulmão só meu. Acabou o cigarro e dancei sozinha na sala. Aproveitei meu corpo enquanto ele pode. Piano, saxofone, fechei a cortina, deslizei de meias no chão, rodopiei. Que alegria repentina, que delícia. Num solavanco, fui até o banheiro e fiz xixi e escovei meus dentes, porque me deu uma vontade imensa de escová-los. Sempre escove muito bem atrás dos dentes. Depois me enfiei debaixo do chuveiro quente, lavei minha calcinha e a esqueci em cima do box. Paciência. O disco ainda tocando, corri pro quarto e me enfiei no pijama azul-calcinha-de-vó. Nada mais confortável. No começo achei que não dançaria nada assim. Arrasei na pista.
Depois comi Cheetos de Lua queijo parmesão e me perguntei porque Lua se ele tem formato de bactéria. E lua ou é redonda ou é semi-circular, mas não um bastonete. Vai saber. Tomei suco de maracujá. E ainda estou com fome e com frio. E com sono. Mas estou tão de bem comigo que , não sei. Superstições. Pensei em fumar outro cigarrinho. Por pura graça. Nunca gostei de cigarros, mas no começo achei que não fumaria nada assim. Nada assim sozinha ao som de um jazz.

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