Todas as vezes que eu e meu primo jogávamos bola no quintal de cimento da minha avó, lá pelos poucos anos nossos, a bola de leite, eu jogava no vizinho do fundo, e tínhamos a impressão que ela evaporava sozinha, de repente, assim que caía lá, pois era um terreno baldio e pasmados, ele mais bravo do que pasmo, procurávamos em vão a bola de leite mágica, sumida, abrindo um mistério interrogativo, sem mais brincadeiras, e íamos sentar no degrau com as mãos segurando o rosto, sujos e cansados.
Era o mistério da bola de leite. Das bolas, eram tantas que perdi. Que destino o deus das bolas dava a elas? Viravam queijo derretido? Pão de queijo? Bolas de leite. Foram trocadas por bolas de tênis que serviam para jogar vôlei com um varal se fazendo de rede. Aquilo era o máximo de nossa alegria, tardes e tardes descalços no quintal, jogando bolinhas de gude, bolas de tênis e de leite no fundo do terreno. Depois íamos comprar pão e tomávamos o café da tarde, o café bem docinho era o da minha avó, pão com manteiga ou mortadela, sem muito luxo, com muita alegria, com muita infância, a fome de infância que devorava tudo aquilo, devorava até a tristeza do sumiço da bola de leite.
E porque só eu era quem jogava a bola bem forte pra ela sumir? Nunca era ele. Ele se tornava quase que imune às imperfeções, o bom dos bons, mas eu gostava, gostava muito dele, ainda gosto, por mais que não o veja, e isso acabou se tornando, sem querer, uma boa lembrança do meu primo, com quem eu passei quase que minha infância toda, entre brigas e malvadezas, brincadeiras e conversas.
E são, na maioria, bem na maioria, momentos muito bons, que agarrei sem querer também com tanto carinho e guardo ainda, atrás da orelha uma história que o vento me conta, atrás da boca que sai sem querer. Guardo a infância, a velha, guardo a nova, cotidiana, essa, eterna.
Um comentário:
lindo...linda...
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