segunda-feira, 15 de agosto de 2011

mês oito

o mês de agosto pra ser tomado com chá bem quente
a pressa queima a língua
arde toda
o dia todo
e ainda no outro dia

o mês de agosto problemático
pulmão asfixiado
ao gosto de quem
nem bombinha usa
e se recusa
acha que é droga
acha que é nada
a vida
diante de tudo

o oitavo mes de doer
a coluna
o coração
a orelha
a língua
de passar olhando o teto
chorando na cama
enquanto ve as sombras da janela
projetadas pelo farol de algum carro passando

e passa
daqui a pouco é setembro, dezembro
natal, ano novo
e agosto
de novo

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Nenhuma citação

começo encontrando um pêlo de cachorro na minha blusa preta, mas isso não tem a ver com o que direi em seguida.

Garoava. As pessoas são como livros. Só a descobrimos se as lemos. Caso contrário, nada sabemos delas, estão sempre fechadas, não existem.
Muitas andando pela rua, enquanto eu, encostada numa parede no ponto de ônibus, as olhava com uma tal frieza de que nunca antes havia sentido. Eu amargava cada garoinha, entristeci, eu também era um livro fechado, eu me rabiscava por dentro... e ninguém me via.
Subia, com um colete de "save the children", uma moça, cuja qual, assim que olhei fechei ainda mais minha expressão. Eu sentia que ela pararia pra me fazer perguntas, mas sei lá, não, não, essas pessoas são chatas, eu nem havia salvado a criança que estava em mim ainda, ou nem havia matado de vez todas as teorias acumaladas durante essa vida curta, de repente senti uma raiva dela, ela me abordaria, não era o momento, a garoa garoava e a moça andava um pouco rápido quando, eu com medo de olha-lá, a olhei nos olhos e ela sorriu pra mim. Ela sorriu pra mim. Ela me leu naquele momento, meus olhos se encheram de garoa, meu livro todo se espatifou no chão virando as páginas ao vento, molhando, derretendo... e passou.
A olhei de costas, ela não viraria. Eu queria correr atrás dela, me salve. Talvez eu tenha sido a única criança que ela tenha salvado realmente na vida. Só por uns instantes.


De resto, a vida ia mesmo como nunca imaginei que fosse, a gente nunca imagina nada do que é, o que parece ser mas não é, o não ser, o não parecer.
Eu não sei onde estou, e a cada momento não sei mesmo quem eu sou. Sou eu em relação a quem?  A mim mesma? A alguém? Aos outros?
Um cabelo longo e ruivo com uma máscara de médico na cara, de repente.
Que conclusões tirar da vida?
Eu era uma mar de perguntas, as respostas talvez viessem juntas, como o sal, mas ardiam.
- Alô! Acorda. Olha pra sua vida, a sua... o que é a sua. Não a minha, nem a dela.
É esse o problema. É isso que não está direito, se é mesmo que sei o que é direito.
Na verdade as duas dizem a mesma coisa. Na verdade eu já estava mesmo sozinha sem ninguém e assim eu acho que não machuco mais. Hoje, ao me enxugar no banheiro, tentei me imaginar num quarto de hotel de frente pro mar, sozinha, palmeiras, areia. Mas era o meu banheiro mesmo, com restos mortais de sujeiras alheias, uma coisa meio emporcalhada.
A essa altura talvez nem me importava se era metade ou inteiro, era o que sentia. Não entenda se não quiser.
Imaginamos tanto tudo ao mesmo tempo, só me resta meia hora.
não, o abstrato não serve, assim, de longe, sempre viveremos no abstrato mesmo tocando a pele.
não procuro ninguém, procuro a mim mesma. nem eu consigo imaginar anular uma coisa que é minha, mas ao mesmo tempo soou massacrada duas vezes por que gosto demais. e se eu odiasse?
todas as palavras estão me doendo como agulha
acho que mergulhamos todas num mesmo balde, e esse balde é pequeno, é pequeno pra tudo, nem eu sozinha caiba nele, preciso pular no mar
imaginamos imaginamos
escancarei todas as minhas páginas e agora elas queimam queimam no frio de inverno e verão nada definido. as folhas caem, como no outono.
ahhhhhh
é tudo uma massa amorfa
tudo é nada
a parte isso tenho em mim todas as teorias canalhas do mundo

domingo, 7 de agosto de 2011

hoje eu não quis fotografar as coisas belas
egoísta

Preguiça da vida

" ser poeta não é minha ambição
é minha maneira de estar sozinho"

assim que eu queria ficar, encostadinha solitária pensando em nada
em ninguém
talvez no mar
na brisa que vem do mar e salga sem querer o meu rosto
ou nas bicicletas passeando pela via
um lapis
um papel
tudo talvez que seja ordinário
tantos sonhos
a vida, a água de coco
essa menina saindo do banho
a beira do mar com conchas
sereia
ou borboleta
um beijo no ombro
minha maneira
de ter asas

sábado, 6 de agosto de 2011

Iniciação para Recuperar o Ar

Você sabe quem é?
Quem te divide ao meio
ou um terço
uma parte é sua
e as outras duas
quem são?
existem?

hoje sonhei com cabelos compridos
pele morena
que saudade
hoje preciso escrever tudo
evaporar toda essa coisa presa aqui dentro essa coisa que nunca sabemos realmente o que é se é se foi se vai se fica quantos ses e se não existem o ses as coisas só seriam e ninguem duvidaria e se meu nome é Graça ou Cássia

(ontem mesmo conheci a Graça, ela é negra e linda e tem voz grossa)

mas aqui por dentro pululam coisas estranhas e eu nunca nunca vou poder decidir podem os anjos e arcanjos pode o tinhoso me chicotear com plumas de avestruz pode de pena me pisotear e eu vou repetir com todo o grito do mundo
eu gosto de você
e
eu gosto de você
e esse ar vai sair de mim e entrar novamente como um recém nascido respira pela primeira vez e chora
todo ensanguentado e meu coração vai se abrir as arterias fluirão mais sangue meu pulmao vai se encher
esse silêncio vai explodir em particulas de luz radiantes do sol
pode ser que eu sofra ainda sem saber ao certo o que sou
talvez eu saiba o que eu sinto
não me julguem nem me condenem por não ser o que queriam nem seguir metodicamente uma regra social idiota e tão encravada no nosso âmago no meu também
mas eu gosto, gosto gosto amo gosto muito e morro de saudade e sonho à noite delirando
que agora nem posso chorar
se chorar eu pudesse
mas tantos ses não sei não fazem sentido nada faz
não sou nada
só sou alguém que gosta de você e de você
eu gosto
e aí você sabe o que
é
se é
se vai se fica
se foi se nada